Quando mudei o nome deste blog, queria algo que soasse menos pretensioso e, também, menos afrescalhado que o anterior (but not in love). Alguma coisa que casasse com o slogan e que também tivesse a ver com comida - mal sabia eu, na época, que faria um outro blog, o Teste Cego, só com esta finalidade.
Enfim. Foi assim que surgiu o validade vencida.
Acontece que a mudança gerou um efeito colateral: uma horda de gente estranha que cai aqui procurando coisas bizarras no Google. Graças ao Google Analytics, ferramenta gratuita que mede estatísticas de blogs e sites (que eu recomendo altamente) e é mais confiável que o medidor do Blogger, dá para saber exatamente o que atrai esse pessoal todo.
Como não posso ignorar meu público, resolvi ajudá-los, respondendo alguns termos que as pessoas TIVERAM O TRABALHO de digitar no Google e, vejam só, encontraram meu blog como resposta.
"pode sibutramina vencida?" - melhor não, amigo (a). A Anvisa já proibiu a venda do produto dentro do prazo de validade, imagine fora. Toma vergonha na cara, fecha a boca e vai dar uma corridinha, vai.
"pode tomar cerveja skol vencida há um mês?" - não recomendo tomar Skol em nenhuma circunstância. Mas cada um, cada um, então vai fundo: aproveita e deixa ela quente e sem gás também, talvez melhore um pouco.
"posso ir para a argentina com identidade vencida de ônibus" - identidade vencida? Que merda é essa?
"qual é o problema de comer frango com validade vencida?" - sinceramente? Acho que o máximo que pode acontecer é uma baita de uma dor de barriga. Mas só acho. Deixa a carteirinha da Unimed aí do lado, só pra garantir, e manda ver.
"tenha um bom dia" - obrigado, você também.
"ribeirão preto opções para jantar de segunda-feira" - eu juro que não me lembro de ter saído para jantar numa segunda-feira em Ribeirão Preto. Muito menos de ter falado sobre isso no blog.
"qual a melhor cerveja brahma, skol ou antarctica" - rá! Esse eu ajudei de verdade. Mas não é nenhuma das três. É Itaipava, já disse.
"sua validade ta vencida te exclui da minha vida ja tem outro em seu lugar letra" - que beleza!
"trocadilhos pífios" - finalmente, uma bola dentro do Google. Trocadilho pífio é comigo mesmo. Esse aí encontrou o que queria.
30 de dezembro de 2010
28 de dezembro de 2010
Compras
Ah, o consumo.
É bem sabido que o ato de comprar certas vezes é bem mais prazeroso que utilizar o próprio objeto comprado, e enquanto não inventarem uma droga que não mate ou engorde, é assim que vamos: às compras.
Fim de ano é sempre aquela coisa, e antes de continuar eu já quero dizer que é claro que eu gosto de fazer compras. Acontece que eu me meti em uma família (no melhor sentido possível, gente) onde no Natal é tradição máxima trocar presentes. E o pessoal não está muito disposto a simplesmente entrar no shopping, olhar e comprar. Ainda mais quando tem mulher no meio, meu amigo.
Não, não. Tem de pesquisar, ir até os lugares mais baratos (mesmo que isso inclua ter de se deslocar alguns quilômetros), olhar no concorrente, ver na internet, voltar para aquela loja na esquina onde a vendedora era mais atenciosa... A coisa toda dura meses, e tem requintes de um grande evento.
Eu já acompanhei várias dessas jornadas. Elas sempre duram horas, e invariavelmente termina comigo e meu cunhado emburrados sentados em um banqunho qualquer, com sacolas na mão, esperando minha mulher/namorada dele, minha cunhada e minha sogra/mãe dele saírem de mais uma loja e entrarem em outra para dizerem "agora é sério, é só mais essa".
Meu sogro, já calejado, trata de inventar uma desculpa qualquer e fica em casa. Chego a supor que o grande motivo dele ter tido um filho e deixado sua filha casar comigo seja esse: ter alguém para levar a turma às compras para poder descansar.
Bom, baseado em algumas dessas experiências, desenvolvi uma espécie de manual sobre o comportamento feminino diante de determinados produtos. Vale dizer que eu continuo sem entender muita coisa, e isso tudo não tem propósito algum, a não ser, quem sabe, preparar algumas almas masculinas para a próxima temporada de compras.
Sapatos - cara, não dá pra entender a fixação das mulheres por sapatos. Tem sapato para trabalhar, sapato para o dia a dia, sapato para ficar em casa, sapato para sair de manhã, sapato para sair ao pôr do sol, sapato para ir no restaurante japonês. E, para cada categoria, elas têm que ter uns 15 pares diferentes. Duro é achar. Minha mulher mesmo diz que o pé dela é "alto". Então os modelos A, B, C, D, E e F não servem. Mas se for o A, com a forma do F, na numeração 35, e se for de couro, talvez dê certo. Ah, mas está caro. Na outra loja tem o modelo D 34 de vinil com saltinho baixo que ficou legal e está em promoção. Aí ela acaba levando o modelo Z, que ela achou na loja Y, para no dia seguinte dizer: "puxa, eu realmente deveria ter levado aquele de couro..."
Roupas - a calça fica boa na cintura, mas apertada na perna. Opa, tá boa na perna, mas não entra na cintura. Outro modelo? "Não tem mais, moça, acabou tudo ontem. Mas tem essa com o tecido mais macio, e outra modelagem, pode ser que sirva." Ficou ótimo! Mas é caro. O marido, é claro, acaba convencido porque vai ficar PER-FEI-TO com aquela blusinha que ela ainda vai comprar...
Bijouterias - em um grande shopping de bijouterias em Limeira, cometi o deslize de dizer que não entendia os critérios da minha mulher para comprar tais ornamentos. Ela, então, diante de um grande mostruário de colares, me pediu: "diz aí, qual você compraria para mim?" Desespero total. Suor. Ela ficou irredutível. Apontei para um modelo mais simples, ela fez uma cara de muchocho, não desaprovou mas também não morreu de amores. Deve ter sido gentil. Mais para frente, nos deparamos com um modelo bem parecido, de outra loja: "AI QUE LINDO!" Desisto.
Presentes para minha família - por mim, tudo se resolveria com DVDs e livros. Ou, melhor ainda, vale-presentes. Mas não, imagine, que falta de sensibilidade. Aí toca ver alguma coisa para as quatro irmãs (que agrade a todas e que, ao mesmo tempo, seja igual para evitar crises de inveja), algo diferente para minha mãe (mas não tão diferente assim para que as irmãs não vejam um grande beneficiamento), qualquer coisa para os cunhados (é só não repetir o que foi dado no ano passado, eles nem ligam) e algo para os sobrinhos. Bem medido, porque eles ainda podem não saber quantificar crises de inveja, mas seus pais sabem. Eu adoro minha família.
É bem sabido que o ato de comprar certas vezes é bem mais prazeroso que utilizar o próprio objeto comprado, e enquanto não inventarem uma droga que não mate ou engorde, é assim que vamos: às compras.
Fim de ano é sempre aquela coisa, e antes de continuar eu já quero dizer que é claro que eu gosto de fazer compras. Acontece que eu me meti em uma família (no melhor sentido possível, gente) onde no Natal é tradição máxima trocar presentes. E o pessoal não está muito disposto a simplesmente entrar no shopping, olhar e comprar. Ainda mais quando tem mulher no meio, meu amigo.
Não, não. Tem de pesquisar, ir até os lugares mais baratos (mesmo que isso inclua ter de se deslocar alguns quilômetros), olhar no concorrente, ver na internet, voltar para aquela loja na esquina onde a vendedora era mais atenciosa... A coisa toda dura meses, e tem requintes de um grande evento.
Eu já acompanhei várias dessas jornadas. Elas sempre duram horas, e invariavelmente termina comigo e meu cunhado emburrados sentados em um banqunho qualquer, com sacolas na mão, esperando minha mulher/namorada dele, minha cunhada e minha sogra/mãe dele saírem de mais uma loja e entrarem em outra para dizerem "agora é sério, é só mais essa".
Meu sogro, já calejado, trata de inventar uma desculpa qualquer e fica em casa. Chego a supor que o grande motivo dele ter tido um filho e deixado sua filha casar comigo seja esse: ter alguém para levar a turma às compras para poder descansar.
Bom, baseado em algumas dessas experiências, desenvolvi uma espécie de manual sobre o comportamento feminino diante de determinados produtos. Vale dizer que eu continuo sem entender muita coisa, e isso tudo não tem propósito algum, a não ser, quem sabe, preparar algumas almas masculinas para a próxima temporada de compras.
Sapatos - cara, não dá pra entender a fixação das mulheres por sapatos. Tem sapato para trabalhar, sapato para o dia a dia, sapato para ficar em casa, sapato para sair de manhã, sapato para sair ao pôr do sol, sapato para ir no restaurante japonês. E, para cada categoria, elas têm que ter uns 15 pares diferentes. Duro é achar. Minha mulher mesmo diz que o pé dela é "alto". Então os modelos A, B, C, D, E e F não servem. Mas se for o A, com a forma do F, na numeração 35, e se for de couro, talvez dê certo. Ah, mas está caro. Na outra loja tem o modelo D 34 de vinil com saltinho baixo que ficou legal e está em promoção. Aí ela acaba levando o modelo Z, que ela achou na loja Y, para no dia seguinte dizer: "puxa, eu realmente deveria ter levado aquele de couro..."
Roupas - a calça fica boa na cintura, mas apertada na perna. Opa, tá boa na perna, mas não entra na cintura. Outro modelo? "Não tem mais, moça, acabou tudo ontem. Mas tem essa com o tecido mais macio, e outra modelagem, pode ser que sirva." Ficou ótimo! Mas é caro. O marido, é claro, acaba convencido porque vai ficar PER-FEI-TO com aquela blusinha que ela ainda vai comprar...
Bijouterias - em um grande shopping de bijouterias em Limeira, cometi o deslize de dizer que não entendia os critérios da minha mulher para comprar tais ornamentos. Ela, então, diante de um grande mostruário de colares, me pediu: "diz aí, qual você compraria para mim?" Desespero total. Suor. Ela ficou irredutível. Apontei para um modelo mais simples, ela fez uma cara de muchocho, não desaprovou mas também não morreu de amores. Deve ter sido gentil. Mais para frente, nos deparamos com um modelo bem parecido, de outra loja: "AI QUE LINDO!" Desisto.
Presentes para minha família - por mim, tudo se resolveria com DVDs e livros. Ou, melhor ainda, vale-presentes. Mas não, imagine, que falta de sensibilidade. Aí toca ver alguma coisa para as quatro irmãs (que agrade a todas e que, ao mesmo tempo, seja igual para evitar crises de inveja), algo diferente para minha mãe (mas não tão diferente assim para que as irmãs não vejam um grande beneficiamento), qualquer coisa para os cunhados (é só não repetir o que foi dado no ano passado, eles nem ligam) e algo para os sobrinhos. Bem medido, porque eles ainda podem não saber quantificar crises de inveja, mas seus pais sabem. Eu adoro minha família.
14 de dezembro de 2010
Mario é o cara
Eu devia ter uns 10 anos quando conheci o Mario, e não foi atrás do armário (pronto, já foi a piada!). Foi no chamado Nintendinho, console da Nintendo com 8 bits, espécie de "passo adiante" em relação ao Atari.
O jogo era o Super Mario Bros., e consistia basicamente em levar um carinha bigodudo a pular sobre inimigos e obstáculos por fases e mundos para matar o Bowser, seus filhos, e resgatar a princesa.
Alguns anos depois, em um dia obscuro de novembro, minha cachorra foi atropelada. E minha mãe, para diminuir minha angústia infantil e reduzir as chances de eu me tornar um adolescente-problema, resolveu antecipar meu presente de Natal daquele ano, que já estava comprado do Paraguai: um Super Nintendo. Que vinha com dois controles e um jogo: Super Mario World.
Para encurtar a história, foi o jogo que me fez ficar de recuperação em umas três matérias na quinta série, e que certamente levou minha mãe a se arrepender por tê-lo comprado. Mario é um droga, e meu vício começava ali.
Com o tempo, porém, meu interesse pelo videogame diminuiu, eu comecei a trabalhar e não ter mais tanto tempo e dinheiro para esses luxos. Até que me casei. E decidimos, eu e minha mulher, investir em videogame: é entretenimento para a família, afinal de contas.
A escolha, é claro, foi pela Nintendo. Tá, todo mundo sabe que o Xbox ou o PS3 são melhores. Mas eles não têm a franquia Mario (nem Donkey Kong, mas essa é outra história). Então fomos direto no Wii, que além de embutir o padrão Nintendo de diversão, permite simular atividades esportivas com os movimentos do controle e aquela coisa toda.
E assim nossa vida seguiu, com um Guitar Hero aqui, um Beatles Rock Band ali, um Mario Kart acolá, boliche de vez em quando. Até que o New Super Mario Bros Wii surgiu. E meu dedão da mão esquerda voltou a ter calos.
Antes de mais nada, vale dizer que não é apenas um jogo. É uma homenagem. Uma grande homenagem aos fãs da Nintendo, do Mario e, principalmente, aos fãs da diversão eletrônica. É espetacular, sensacional e, em alguns momentos, de fato me deixou boquiaberto (não leve como parâmetro: eu sou meio bobo mesmo).
Tem que jogar. Vale dizer que o New Super Mario Bros. do Wii é a evolução direta do Mario Bros. do Nintendinho. Esqueça, então, a onda 3D do Mario 64 ou do Mario Galaxy (nada contra, mas essas coisas me deixam meio tonto, sério). É 2D na veia, mano. Telona chapada, fase começa do lado esquerdo, termina do direito. Simples assim.
Nem tanto, na verdade. Não queria ficar aqui resenhando o jogo, mas vamos lá: a jogabilidade é um personagem à parte. Você usa o direcional, dois botões e uma chacoalhadinha no controle. Com isso tudo junto e misturado, ou não, consegue botar o Mario para correr, voar, se agarrar em paredes, girar e "segurar" o pulo no ar, segurar coisas (e pessoas), dar um salto triplo para pular mais alto...
Juro que não vou nem falar do capacete-helicóptero e, principalmente, do pinguim. Da possibilidade de jogar com quatro jogadores NA MESMA FASE. Dos inimigos que fazem coreografias de acordo com a trilha sonora (cara, isso é DEMAIS). Do guia de ajuda quando você morre mais de oito vidas na mesma fase. Ou dos "hint movies", que te mostram como é que se joga de verdade. Seria muita humilhação.
O jogo também incorpora movimentos do Yoshi's Island, que é simplesmente o game mais subestimado da história da Nintendo (é uma espécie de Super Mario World 2, só que muito melhor). Quando eu peguei o Yoshi pela primeira vez e vi que ele podia "voar", meus olhos se encheram de lágrimas (se ele botasse ovos para depois atirá-los, eu seria capaz de correr nu pela rua, tamanha seria minha alegria).
Ao mesmo tempo em que evolui, o jogo mantém tudo o que o transformou em um ícone mundial, não só dos games, mas da cultura pop: saídas secretas, lugares escondidos, o mesmo esquema de fases e mundos, os castelos, os chefões, o enredo...
Tudo para dizer o seguinte: Red Dead Detemption, GTA, Warcraft, Gran Turismo, Winning Eleven, Fifa, Guitar Hero... Sim, tudo muito legal, mas para mim não há o que supere Mario. Os concorrentes têm que comer bastante feijão. Ou um cogumelo vermelho, quem sabe...
O jogo era o Super Mario Bros., e consistia basicamente em levar um carinha bigodudo a pular sobre inimigos e obstáculos por fases e mundos para matar o Bowser, seus filhos, e resgatar a princesa.
Alguns anos depois, em um dia obscuro de novembro, minha cachorra foi atropelada. E minha mãe, para diminuir minha angústia infantil e reduzir as chances de eu me tornar um adolescente-problema, resolveu antecipar meu presente de Natal daquele ano, que já estava comprado do Paraguai: um Super Nintendo. Que vinha com dois controles e um jogo: Super Mario World.
Para encurtar a história, foi o jogo que me fez ficar de recuperação em umas três matérias na quinta série, e que certamente levou minha mãe a se arrepender por tê-lo comprado. Mario é um droga, e meu vício começava ali.
Com o tempo, porém, meu interesse pelo videogame diminuiu, eu comecei a trabalhar e não ter mais tanto tempo e dinheiro para esses luxos. Até que me casei. E decidimos, eu e minha mulher, investir em videogame: é entretenimento para a família, afinal de contas.
A escolha, é claro, foi pela Nintendo. Tá, todo mundo sabe que o Xbox ou o PS3 são melhores. Mas eles não têm a franquia Mario (nem Donkey Kong, mas essa é outra história). Então fomos direto no Wii, que além de embutir o padrão Nintendo de diversão, permite simular atividades esportivas com os movimentos do controle e aquela coisa toda.
E assim nossa vida seguiu, com um Guitar Hero aqui, um Beatles Rock Band ali, um Mario Kart acolá, boliche de vez em quando. Até que o New Super Mario Bros Wii surgiu. E meu dedão da mão esquerda voltou a ter calos.
Antes de mais nada, vale dizer que não é apenas um jogo. É uma homenagem. Uma grande homenagem aos fãs da Nintendo, do Mario e, principalmente, aos fãs da diversão eletrônica. É espetacular, sensacional e, em alguns momentos, de fato me deixou boquiaberto (não leve como parâmetro: eu sou meio bobo mesmo).
Tem que jogar. Vale dizer que o New Super Mario Bros. do Wii é a evolução direta do Mario Bros. do Nintendinho. Esqueça, então, a onda 3D do Mario 64 ou do Mario Galaxy (nada contra, mas essas coisas me deixam meio tonto, sério). É 2D na veia, mano. Telona chapada, fase começa do lado esquerdo, termina do direito. Simples assim.
Nem tanto, na verdade. Não queria ficar aqui resenhando o jogo, mas vamos lá: a jogabilidade é um personagem à parte. Você usa o direcional, dois botões e uma chacoalhadinha no controle. Com isso tudo junto e misturado, ou não, consegue botar o Mario para correr, voar, se agarrar em paredes, girar e "segurar" o pulo no ar, segurar coisas (e pessoas), dar um salto triplo para pular mais alto...
Juro que não vou nem falar do capacete-helicóptero e, principalmente, do pinguim. Da possibilidade de jogar com quatro jogadores NA MESMA FASE. Dos inimigos que fazem coreografias de acordo com a trilha sonora (cara, isso é DEMAIS). Do guia de ajuda quando você morre mais de oito vidas na mesma fase. Ou dos "hint movies", que te mostram como é que se joga de verdade. Seria muita humilhação.
O jogo também incorpora movimentos do Yoshi's Island, que é simplesmente o game mais subestimado da história da Nintendo (é uma espécie de Super Mario World 2, só que muito melhor). Quando eu peguei o Yoshi pela primeira vez e vi que ele podia "voar", meus olhos se encheram de lágrimas (se ele botasse ovos para depois atirá-los, eu seria capaz de correr nu pela rua, tamanha seria minha alegria).
Ao mesmo tempo em que evolui, o jogo mantém tudo o que o transformou em um ícone mundial, não só dos games, mas da cultura pop: saídas secretas, lugares escondidos, o mesmo esquema de fases e mundos, os castelos, os chefões, o enredo...
Tudo para dizer o seguinte: Red Dead Detemption, GTA, Warcraft, Gran Turismo, Winning Eleven, Fifa, Guitar Hero... Sim, tudo muito legal, mas para mim não há o que supere Mario. Os concorrentes têm que comer bastante feijão. Ou um cogumelo vermelho, quem sabe...
30 de novembro de 2010
Sujeira
Dia desses aí pra trás, eu fui fazer uma matéria sobre o lançamento de um carro. Nunca tinha feito esse tipo de cobertura antes, mas sabia que esses eventos eram cheios de pompa e circunstância. De vários colegas com quem já trabalhei, cansei de ouvir histórias sobre viagens até para cidades da Europa (teve um que bateu um carrão num test drive em Barcelona). Enfim.
Fui escalado, aceitei o convite e fui, todo serelepe.
O evento foi em Foz do Iguaçu. Saí de Ribeirão Preto em uma segunda-feira à noite, fui de avião até São Paulo. Me hospedaram em um hotel onde a diária custa R$ 315. Ao chegar lá, fui recebido por dois funcionários da montadora que estava lançando o carro. Me ajudaram com o check-in e disseram para eu ficar à vontade para descer e jantar. Assim o fiz. Era um buffet: comi uma saladinha, um macarrãozinho e um peixinho esperto. Tomei uma água. Como já passava das 22h, me controlei para evitar a pedreiragem.
Depois que comi, um funcionário do hotel me pediu para assinar a nota, "só para controle": o jantar havia custado R$ 65. No dia seguinte, de manhãzinha, toca para Foz (a viagem Ribeirão-Foz, com conexão em Guarulhos, sai por R$ 630). Antes, o check-out: como havia consumido uma água no frigobar, mais R$ 4,50 na conta da montadora.
Chegando em Foz, um belo café da manhã nos esperava no aeroporto. Todos os jornalistas (exatamente 27, de todo o País) chegaram mais ou menos no mesmo horário. Uma sala foi reservada para um breve briefing a fim de explicar o que seria todo o evento e, principalmente, o test-drive do carro, que seria dali a pouco.
Saímos do aeroporto e pegamos o carro, em duplas. Tínhamos que chegar ao restaurante em Puerto Iguazu, cidade argentina que faz fronteira com Foz. No meio do caminho, uma parada para a troca de motoristas. Neste ponto, mais comida: empanadas argentinas, medialunas (croissants), bolos, refrigerante, café... Não eram nem 12h e eu já tinha feito quatro refeições: café no hotel em São Paulo, café no avião, café no aeroporto em Foz e "lanche da manhã" em um lugar perdido de uma estrada na Argentina. Que beleza.
Lá pelas 13h30, chegamos no tal restaurante. Tínhamos duas opções de prato principal, carne ou peixe. Escolhi (eu e toda a mesa onde estava sentado) a carne. Um bife de chorizo que devia ter, sei lá, uns 400g. Sendo uns 30% de sangue. Para a sobremesa também eram duas opções: umas tais "frutas selvagens" (nada mais que frutas da mata local, que encontramos em qualquer feira aqui no Brasil) ou o "duo de chocolate" (mousse de chocolate com sorvete de chocolate branco). Adivinhem só qual foi a mais popular.
Não perguntei os preços dos pratos, mas uma consulta rápida em guias da internet me mostrou que um prato lá custa, em média, R$ 30. Mais a entrada, sobremesa e bebidas... Bota aí uns R$ 70 por cabeça.
Aí fomos ao hotel em Puerto Iguazu onde seria a coletiva de imprensa, o jantar e onde dormiríamos naquela noite. A diária? Acho que R$ 390, pesquisando no site não tenho certeza de qual foi o tipo de quarto em que eles me puseram. Mas é no mínimo isso. O hotel é cinco estrelas e fica no meio do mato, a 15 minutos das cataratas. No Brasil, acho que a construção dele teria violado umas 585 leis ambientais.
Na cama, tinha uma camiseta com o logo da montadora e do carro e uma cartinha: "Sua presença é muito importante, blá blá blá, fique à vontade para usar essa camiseta na coletiva e no jantar". Na hora, pensei: "Que ridículo, quem vai usar isso?"
Alguns minutos depois, na coletiva, do grupo de 27 jornalistas, pelo menos metade usava. Sei lá, mas eu achei muito constrangedor. Tudo bem que os caras pagaram tudo pra você estar ali, mas acho que não precisa, literalmente, VESTIR A CAMISA. Né? Sobre isso, falamos mais abaixo.
Na coletiva, cada um ganhou seu bloquinho, sua caneta e um pen-drive (4gb de capacidade total; 300mb utilizados - VOCÊS OUVIRAM ISSO?) com fotos e textos sobre o carro. É o kit "agrada jornalista". Você pode pagar jantar, passagem de avião e hotel cinco estrelas, mas se não tiver bloquinho e caneta...
Bom, aí fomos ao jantar. Tudo muito chique - com exceção, é claro, das camisetas que uniformizavam o salão. Coquetel, entrada, e vinho. Muito vinho. Eu, muito burro, não gravei o rótulo. E, depois de umas três taças, isso não seria possível nem mesmo se eu quisesse.
A entrada era... juro que não lembro. Imperdoável. O prato principal podíamos escolher entre duas opções: lombo ao molho de cerveja preta e purê ou ave enrolada na panceta (não se engane: é o popular medalhão de frango com bacon, só que mais chique) com risoto de amêndoas. Pensando agora eu não sei porquê, mas fui na segunda opção. Estava bom, de qualquer forma. De sobremesa, panqueca de doce de leite ou frutas com sorvete de coco. Fui nas frutas - o sorvete estava espetacular, aliás.
Infelizmente, não faço ideia do quanto custaria individualmente esse jantar. No dia seguinte, depois do café da manhã, estava programado um passeio por um tal de Duty Free Shop - é como um free shop de aeroporto, só que não fica no aeroporto. É bem pequeno, e as coisas não eram muito baratas. Preferia ter ido ver as cataratas. No ônibus que nos levou até lá, tinha uma mochila em cada banco - mais um presente da montadora. O indefectível logo cravado e mais uma cartinha de agradecimento.
Aeroporto de Foz, Guarulhos, Ribeirão. Ufa.
Algumas considerações.
Só comigo, pelo que consegui mais ou menos mensurar, gastaram R$ 2,1 mil). Isso exclui os gastos com o jantar; brindes (bloquinho, camiseta, mochila etc.); transporte de ônibus até o free shop; seguro do carro; gasto com pessoal de apoio (era muita gente) etc.
Junto comigo, foram mais 26 jornalistas. O lançamento foi dividido em três dias; cada um deles com 30 jornalistas, em média. Galera de todo o Brasil, é bom que se diga. Vamos supor que fossem todos de Ribeirão Preto: a montadora teria gasto, no mínimo, R$ 189 mil.
É um cálculo bem inocente, claro. Foi muito mais do que isso, e eu nem consigo imaginar quanto (enquanto estava bêbado, perguntei para a assessora de imprensa quanto tudo havia custado; ela riu e disse: "ih, isso tem que perguntar pro meu chefe". Sei...)
Aí vamos a outra questão: o carro custa cerca de R$ 80 mil. Então, basta vender três unidades que tá mais do que pago. Compensa? Claro que compensa!
Simplesmente porque nenhuma forma de publicidade é mais eficiente do que o jornalismo. Ou alguém acha que tinha alguém lá pra fazer jornalismo? É um acordo tácito, e ninguém fala sobre isso, mas todo mundo sabe: a empresa gasta mundos e fundos para agradar os coleguinhas, que em troca vão falar de seu produto. E não precisa nem falar bem, basta apenas FALAR.
De uma forma ou de outra, o produto estará na mídia, sendo visto, e a não ser que ele tenha uma peça autoexplosiva ou explore o trabalho de crianças cegas e amputadas em sua fabricação, a exposição será sempre positiva.
É muito mais eficiente, por exemplo, que a publicidade "direta" - as propagandas em TV, jornais, revistas e grandes portais. Porque dessa forma a empresa acaba gastando bem mais sem a certeza de que vai atingir e seduzir o público.
Os caras do marketing da montadora sabem disso, o presidente da empresa sabe disso, a assessora de imprensa com sorriso maroto sabe disso. Os leitores, consumidores de notícias, é que não sabem, coitados. E acabam comprando como "jornalismo" o que na verdade é a reprodução amplificada, pelos veículos de comunicação, de peças de divulgação criadas pelas empresas. Cada um à sua maneira, com um filtro aqui e outro ali, mas ainda assim, a mensagem inicial da montadora vai estar ali. Bastante eficiente, e porque não dizer, perspicaz.
Os jornalistas são só marionetes no processo. Alguns sabem dessa condição, e simplesmente topam participar do teatro. OK, dá para respeitar. Mas alguns não fazem ideia do que se passa. E aí eu ouço coisas como "ah, vou falar na minha matéria que o carro já foi lançado na Europa faz dois anos, isso eles não colocam no release!" É isso aí, campeão! Bote a boca no trombone! Mude o mundo! E, de quebra, tente aliviar sua culpa por ter comido, bebido e curtido uma jacuzzi de graça.
Mas não esqueça de tirar a camiseta, por favor. É que de vez em quando suja, e precisa lavar.
Fui escalado, aceitei o convite e fui, todo serelepe.
O evento foi em Foz do Iguaçu. Saí de Ribeirão Preto em uma segunda-feira à noite, fui de avião até São Paulo. Me hospedaram em um hotel onde a diária custa R$ 315. Ao chegar lá, fui recebido por dois funcionários da montadora que estava lançando o carro. Me ajudaram com o check-in e disseram para eu ficar à vontade para descer e jantar. Assim o fiz. Era um buffet: comi uma saladinha, um macarrãozinho e um peixinho esperto. Tomei uma água. Como já passava das 22h, me controlei para evitar a pedreiragem.
Depois que comi, um funcionário do hotel me pediu para assinar a nota, "só para controle": o jantar havia custado R$ 65. No dia seguinte, de manhãzinha, toca para Foz (a viagem Ribeirão-Foz, com conexão em Guarulhos, sai por R$ 630). Antes, o check-out: como havia consumido uma água no frigobar, mais R$ 4,50 na conta da montadora.
Chegando em Foz, um belo café da manhã nos esperava no aeroporto. Todos os jornalistas (exatamente 27, de todo o País) chegaram mais ou menos no mesmo horário. Uma sala foi reservada para um breve briefing a fim de explicar o que seria todo o evento e, principalmente, o test-drive do carro, que seria dali a pouco.
Saímos do aeroporto e pegamos o carro, em duplas. Tínhamos que chegar ao restaurante em Puerto Iguazu, cidade argentina que faz fronteira com Foz. No meio do caminho, uma parada para a troca de motoristas. Neste ponto, mais comida: empanadas argentinas, medialunas (croissants), bolos, refrigerante, café... Não eram nem 12h e eu já tinha feito quatro refeições: café no hotel em São Paulo, café no avião, café no aeroporto em Foz e "lanche da manhã" em um lugar perdido de uma estrada na Argentina. Que beleza.
Lá pelas 13h30, chegamos no tal restaurante. Tínhamos duas opções de prato principal, carne ou peixe. Escolhi (eu e toda a mesa onde estava sentado) a carne. Um bife de chorizo que devia ter, sei lá, uns 400g. Sendo uns 30% de sangue. Para a sobremesa também eram duas opções: umas tais "frutas selvagens" (nada mais que frutas da mata local, que encontramos em qualquer feira aqui no Brasil) ou o "duo de chocolate" (mousse de chocolate com sorvete de chocolate branco). Adivinhem só qual foi a mais popular.
Não perguntei os preços dos pratos, mas uma consulta rápida em guias da internet me mostrou que um prato lá custa, em média, R$ 30. Mais a entrada, sobremesa e bebidas... Bota aí uns R$ 70 por cabeça.
Aí fomos ao hotel em Puerto Iguazu onde seria a coletiva de imprensa, o jantar e onde dormiríamos naquela noite. A diária? Acho que R$ 390, pesquisando no site não tenho certeza de qual foi o tipo de quarto em que eles me puseram. Mas é no mínimo isso. O hotel é cinco estrelas e fica no meio do mato, a 15 minutos das cataratas. No Brasil, acho que a construção dele teria violado umas 585 leis ambientais.
Na cama, tinha uma camiseta com o logo da montadora e do carro e uma cartinha: "Sua presença é muito importante, blá blá blá, fique à vontade para usar essa camiseta na coletiva e no jantar". Na hora, pensei: "Que ridículo, quem vai usar isso?"
Alguns minutos depois, na coletiva, do grupo de 27 jornalistas, pelo menos metade usava. Sei lá, mas eu achei muito constrangedor. Tudo bem que os caras pagaram tudo pra você estar ali, mas acho que não precisa, literalmente, VESTIR A CAMISA. Né? Sobre isso, falamos mais abaixo.
Na coletiva, cada um ganhou seu bloquinho, sua caneta e um pen-drive (4gb de capacidade total; 300mb utilizados - VOCÊS OUVIRAM ISSO?) com fotos e textos sobre o carro. É o kit "agrada jornalista". Você pode pagar jantar, passagem de avião e hotel cinco estrelas, mas se não tiver bloquinho e caneta...
Bom, aí fomos ao jantar. Tudo muito chique - com exceção, é claro, das camisetas que uniformizavam o salão. Coquetel, entrada, e vinho. Muito vinho. Eu, muito burro, não gravei o rótulo. E, depois de umas três taças, isso não seria possível nem mesmo se eu quisesse.
A entrada era... juro que não lembro. Imperdoável. O prato principal podíamos escolher entre duas opções: lombo ao molho de cerveja preta e purê ou ave enrolada na panceta (não se engane: é o popular medalhão de frango com bacon, só que mais chique) com risoto de amêndoas. Pensando agora eu não sei porquê, mas fui na segunda opção. Estava bom, de qualquer forma. De sobremesa, panqueca de doce de leite ou frutas com sorvete de coco. Fui nas frutas - o sorvete estava espetacular, aliás.
Infelizmente, não faço ideia do quanto custaria individualmente esse jantar. No dia seguinte, depois do café da manhã, estava programado um passeio por um tal de Duty Free Shop - é como um free shop de aeroporto, só que não fica no aeroporto. É bem pequeno, e as coisas não eram muito baratas. Preferia ter ido ver as cataratas. No ônibus que nos levou até lá, tinha uma mochila em cada banco - mais um presente da montadora. O indefectível logo cravado e mais uma cartinha de agradecimento.
Aeroporto de Foz, Guarulhos, Ribeirão. Ufa.
Algumas considerações.
Só comigo, pelo que consegui mais ou menos mensurar, gastaram R$ 2,1 mil). Isso exclui os gastos com o jantar; brindes (bloquinho, camiseta, mochila etc.); transporte de ônibus até o free shop; seguro do carro; gasto com pessoal de apoio (era muita gente) etc.
Junto comigo, foram mais 26 jornalistas. O lançamento foi dividido em três dias; cada um deles com 30 jornalistas, em média. Galera de todo o Brasil, é bom que se diga. Vamos supor que fossem todos de Ribeirão Preto: a montadora teria gasto, no mínimo, R$ 189 mil.
É um cálculo bem inocente, claro. Foi muito mais do que isso, e eu nem consigo imaginar quanto (enquanto estava bêbado, perguntei para a assessora de imprensa quanto tudo havia custado; ela riu e disse: "ih, isso tem que perguntar pro meu chefe". Sei...)
Aí vamos a outra questão: o carro custa cerca de R$ 80 mil. Então, basta vender três unidades que tá mais do que pago. Compensa? Claro que compensa!
Simplesmente porque nenhuma forma de publicidade é mais eficiente do que o jornalismo. Ou alguém acha que tinha alguém lá pra fazer jornalismo? É um acordo tácito, e ninguém fala sobre isso, mas todo mundo sabe: a empresa gasta mundos e fundos para agradar os coleguinhas, que em troca vão falar de seu produto. E não precisa nem falar bem, basta apenas FALAR.
De uma forma ou de outra, o produto estará na mídia, sendo visto, e a não ser que ele tenha uma peça autoexplosiva ou explore o trabalho de crianças cegas e amputadas em sua fabricação, a exposição será sempre positiva.
É muito mais eficiente, por exemplo, que a publicidade "direta" - as propagandas em TV, jornais, revistas e grandes portais. Porque dessa forma a empresa acaba gastando bem mais sem a certeza de que vai atingir e seduzir o público.
Os caras do marketing da montadora sabem disso, o presidente da empresa sabe disso, a assessora de imprensa com sorriso maroto sabe disso. Os leitores, consumidores de notícias, é que não sabem, coitados. E acabam comprando como "jornalismo" o que na verdade é a reprodução amplificada, pelos veículos de comunicação, de peças de divulgação criadas pelas empresas. Cada um à sua maneira, com um filtro aqui e outro ali, mas ainda assim, a mensagem inicial da montadora vai estar ali. Bastante eficiente, e porque não dizer, perspicaz.
Os jornalistas são só marionetes no processo. Alguns sabem dessa condição, e simplesmente topam participar do teatro. OK, dá para respeitar. Mas alguns não fazem ideia do que se passa. E aí eu ouço coisas como "ah, vou falar na minha matéria que o carro já foi lançado na Europa faz dois anos, isso eles não colocam no release!" É isso aí, campeão! Bote a boca no trombone! Mude o mundo! E, de quebra, tente aliviar sua culpa por ter comido, bebido e curtido uma jacuzzi de graça.
Mas não esqueça de tirar a camiseta, por favor. É que de vez em quando suja, e precisa lavar.
22 de novembro de 2010
Maus
Estou longe de ser um fã de quadrinhos. Quer dizer, gosto bastante de quadrinhos, mas na minha infância/adolescência só lia mesmo gibi da Turma da Mônica. Nunca tive saco para ler os super-heróis. Tampouco sei a diferença entre Marvel e DC Comics.
Hoje, minha paixão pelos quadrinhos basicamente se resume aos sites de alguns malucos que publicam suas tirinhas por aí (olha no menu "de passar mal" aí do lado pra vocês terem uma ideia).
Existe uma discussão toda séria sobre a subestimação dos quadrinhos - para alguns que trabalham com essa forma de expressão, eles se enquadrariam em uma categoria própria de arte, assim como o cinema e a literatura. Para esses aí, falar que quadrinho se reume a gibi ou coisa de criança, como prega o senso comum, chega a ser ofensa.
Quando morei em Jundiaí, logo no início de minha estada na cidade, dividi o apartamento com um colega que tinha alguns quadrinhos diferentes, maiores - são as chamadas graphic novels. Como ele não tinha televisão nem computador, esses livros eram o meu único passatempo quando eu chegava do trabalho.
Desde quando comecei a morar lá, notei um livro bem peculiar. O título era "Maus", e ele tinha o desenho de uma suástica na capa. Na hora, pensei: "Ih, deve ser essas coisas de violência. Tô a fim não." Um dia, porém, esgotadas todas as possibilidades de leitura naquela casa, não teve jeito. Fui ao "Maus".
Na primeira noite, parei de ler às 4h da madrugada. E só porque precisava realmente dormir. Na segunda noite, terminei de ler o livro às 3h. Minha vida tinha mudado um pouquinho. Fiquei por um tempo meio que pensando: começo a reler agora ou espero até amanhã?
"Maus" (a palavra não é tradução; significa "ratos" em alemão) é de um cara chamado Art Spiegelman. Ele é judeu. O livro conta a história de sobrevivência dos pais dele na 2ª Guerra pelos campos de concentração nazistas. "Ih, mais uma história de holocausto! Já tô cheio disso! Coisa chata, Luís!" É, eu pensei isso quando li a orelha do livro também.
Mas Spiegelman usa recursos interessantes na sua história: desenha os judeus como ratos, os alemães como gatos, os poloneses como porcos e os americanos como cachorros. E enquanto reproduz os relatos impressionantes e assustadores de seu pai, retrata também os diálogos que tem como ele para a produção do livro, as brigas, a culpa que sente pelo suicídio da mãe.
Dessa forma, logo depois de um quadrinho onde o pai de Spiegelman aparece pisando sobre cadáveres para ir ao banheiro em Auschwitz, vem um onde ele, nos dias atuais, aparece reclamando do preço da caixa de cereais. É irresistível.
Na semana passada, durante uma crise de enxaqueca que me acordou na madrugada, li "Maus" pela terceira vez. Os efeitos do livro são assustadores. É foda demais, não dá pra definir melhor.
Spiegelman, que ganhou um Pulitzer com a obra e hoje é editor da revista New Yorker, já recusou "N" convites para adaptar "Maus" ao cinema e à TV. Melhor assim: que ele continue imortalizado no gibi.
Hoje, minha paixão pelos quadrinhos basicamente se resume aos sites de alguns malucos que publicam suas tirinhas por aí (olha no menu "de passar mal" aí do lado pra vocês terem uma ideia).
Existe uma discussão toda séria sobre a subestimação dos quadrinhos - para alguns que trabalham com essa forma de expressão, eles se enquadrariam em uma categoria própria de arte, assim como o cinema e a literatura. Para esses aí, falar que quadrinho se reume a gibi ou coisa de criança, como prega o senso comum, chega a ser ofensa.
Quando morei em Jundiaí, logo no início de minha estada na cidade, dividi o apartamento com um colega que tinha alguns quadrinhos diferentes, maiores - são as chamadas graphic novels. Como ele não tinha televisão nem computador, esses livros eram o meu único passatempo quando eu chegava do trabalho.
Desde quando comecei a morar lá, notei um livro bem peculiar. O título era "Maus", e ele tinha o desenho de uma suástica na capa. Na hora, pensei: "Ih, deve ser essas coisas de violência. Tô a fim não." Um dia, porém, esgotadas todas as possibilidades de leitura naquela casa, não teve jeito. Fui ao "Maus".
Na primeira noite, parei de ler às 4h da madrugada. E só porque precisava realmente dormir. Na segunda noite, terminei de ler o livro às 3h. Minha vida tinha mudado um pouquinho. Fiquei por um tempo meio que pensando: começo a reler agora ou espero até amanhã?
"Maus" (a palavra não é tradução; significa "ratos" em alemão) é de um cara chamado Art Spiegelman. Ele é judeu. O livro conta a história de sobrevivência dos pais dele na 2ª Guerra pelos campos de concentração nazistas. "Ih, mais uma história de holocausto! Já tô cheio disso! Coisa chata, Luís!" É, eu pensei isso quando li a orelha do livro também.
Mas Spiegelman usa recursos interessantes na sua história: desenha os judeus como ratos, os alemães como gatos, os poloneses como porcos e os americanos como cachorros. E enquanto reproduz os relatos impressionantes e assustadores de seu pai, retrata também os diálogos que tem como ele para a produção do livro, as brigas, a culpa que sente pelo suicídio da mãe.
Dessa forma, logo depois de um quadrinho onde o pai de Spiegelman aparece pisando sobre cadáveres para ir ao banheiro em Auschwitz, vem um onde ele, nos dias atuais, aparece reclamando do preço da caixa de cereais. É irresistível.
Na semana passada, durante uma crise de enxaqueca que me acordou na madrugada, li "Maus" pela terceira vez. Os efeitos do livro são assustadores. É foda demais, não dá pra definir melhor.
Spiegelman, que ganhou um Pulitzer com a obra e hoje é editor da revista New Yorker, já recusou "N" convites para adaptar "Maus" ao cinema e à TV. Melhor assim: que ele continue imortalizado no gibi.
4 de novembro de 2010
O Curupira e o mistério do savacu
Quem me conhece bem sabe desta história: no ensino médio, eu gostava bastante de biologia. Na hora de escolher o curso da faculdade, eu cogitava essa área, mas como era (era?) meio bobão pensava: "o que diabos vou fazer com diploma de biologia? dar aulas? tô fora!"
Eu queria uma profissão "de verdade". E aí caí no jornalismo, o limbo daqueles que gostam de história, geografia e de ler. Hoje, estou aqui. Não posso dizer que me arrependo por completo, mas depois de descobrir que podia desenvolver carreira acadêmica, fazer pesquisas ou trabalhar em ONGs que cuidam de tartarugas marinhas, sempre bate uma ideia de "putz, e se eu tivesse feito biologia..."
Como todo frustrado, tento preencher o espaço aberto pelo sonho não realizado das mais diversas formas. Neste caso específico, a principal delas é assistindo documentários sobre a vida animal. Sério, eu sou alucinado por essas coisas. O ciclo reprodutivo do salmão, a batalha dos pinguins imperadores para criar seus filhotes e a emboscada dos crocodilos na caça aos gnus já se tornaram clichês para mim, mas mesmo assim eu nunca dispenso boas imagens do reino animal.
Dia desses, no Curupira, em Ribeirão Preto, notei um pássaro diferente. Sinceramente, não sei dizer se ele já estava lá antes. Faz bem mais de um ano que eu frequento assiduamente o lugar. Contei seis indivíduos da espécie (posteriormente, descobri que são sete - um é jovem, com a penugem diferente).
Já sabia que o Curupira tinha uma família de quero-queros (que, aliás, está prestes a aumentar) e uma garça branca, além de vários outros pássaros menores. Mas igual aquele eu nunca tinha visto. É cinza, tem os olhos vermelhos e um diferencial inconfundível: uma pena branca, alongada, na cabeça. Seu corpo é compacto, a penugem lisa, e não fosse pelas longas pernas e asas, passaria fácil fácil por um pinguim.
Não contente em atormentar minha curiosidade, um deles começou a me provocar. É aparentemente o maior deles, o macho alfa ou coisa do tipo. Passou a se exibir sobre uma pedra naquele lago maior da parte central do parque, e posso jurar que certa vez me encarou e soltou um grunhido, abafado pelas guitarras do Black Rebel Motorcycle Club no meu fone de ouvido.
Um belo dia, munido de minha imponente máquina fotográfica, resolvi registrar um pouco mais dos hábitos desta intrigante ave. Pela manhã, ela vai nos lagos do Curupira em busca de peixes. E haja paciência. Olha, entra na água, brinca de estátua, voa de uma margem para outra e demora pacas para pegar um singelo peixe. Seus ancestrais devem ser praticantes do zen-budismo. E adoram um sashimi.
Embora tenha uma vasta experiência com documentários, jamais vira aquela ave no Discovery, National Geographic ou Animal Planet. Recorri ao oráculo de nossos tempos: o Google. Digitei "pássaro cinza com pena branca alongada na cabeça", mas não obtive sucesso.
Conheci, no entanto, o site Wiki Aves - acredito que o nome seja autoexplicativo. Mas lá também era impossível encontrar o pássaro, diante de tantas opções e tão poucas informações que eu tinha a respeito de meu objeto de admiração. A solução foi enviar um e-mail para o administrador do site, Reinaldo Guedes. Anexei duas fotos e passei uma descrição básica do bicho.
Alguns dias se passaram, nada de resposta. Animado, cheguei a cogitar que tivesse descoberto, quem sabe?, uma nova espécie. Imaginei o chefe do Wiki Aves abrindo meu e-mail, exclamando um "oh, meu Deus!" e apertando o botão vermelho que aciona a mais alta cúpula zoológica brasileira para uma reunião de urgência. Visualizei a mim mesmo recebendo uma medalha ou coisa que o valha da Sociedade Nacional de Ornitologia.
Não foi o caso. Finalmente, o e-mail foi respondido.
Prezado Luis Fernando,
Trata-se de um savacu:
http://www.wikiaves.com.br/savacu
Atenciosamente,
Reinaldo Guedes
Devo confessar que o tom do e-mail não me agradou: mostra um certo desleixo, como alguém que diz "ora, meu filho, isso é só um savacu! não me encha o saco!" Mas não tive tempo para ficar com raiva. Estava muito feliz por finalmente poder dar um nome ao ponto de interrogação que sobrevoava minha cabeça há tanto tempo.
Descobri que o savacu tem hábitos noturnos, também é conhecido por uma série de outros nomes (bem menos trocadilhescos, inclusive) e tem como principal "inimigo" os urubus.
Hoje vou mais tranquilo ao Curupira. Já não tenho aquela ansiedade de antes. Mas sempre que vejo as pessoas caminhando, imersas em seus pensamentos, preocupadas com a conta de luz e o IPVA, preciso me controlar para não cutucá-las e dizer: "ei, sabia que aquilo ali é um savacu?"
A ignorância é a felicidade. É o que dizem.
Bônus: o Curupira é um lugar estranho. Em que outro ponto da face da terra uma árvore é capaz de atravessar um alambrado? Alguém explica?
Eu queria uma profissão "de verdade". E aí caí no jornalismo, o limbo daqueles que gostam de história, geografia e de ler. Hoje, estou aqui. Não posso dizer que me arrependo por completo, mas depois de descobrir que podia desenvolver carreira acadêmica, fazer pesquisas ou trabalhar em ONGs que cuidam de tartarugas marinhas, sempre bate uma ideia de "putz, e se eu tivesse feito biologia..."
Como todo frustrado, tento preencher o espaço aberto pelo sonho não realizado das mais diversas formas. Neste caso específico, a principal delas é assistindo documentários sobre a vida animal. Sério, eu sou alucinado por essas coisas. O ciclo reprodutivo do salmão, a batalha dos pinguins imperadores para criar seus filhotes e a emboscada dos crocodilos na caça aos gnus já se tornaram clichês para mim, mas mesmo assim eu nunca dispenso boas imagens do reino animal.
Dia desses, no Curupira, em Ribeirão Preto, notei um pássaro diferente. Sinceramente, não sei dizer se ele já estava lá antes. Faz bem mais de um ano que eu frequento assiduamente o lugar. Contei seis indivíduos da espécie (posteriormente, descobri que são sete - um é jovem, com a penugem diferente).
Já sabia que o Curupira tinha uma família de quero-queros (que, aliás, está prestes a aumentar) e uma garça branca, além de vários outros pássaros menores. Mas igual aquele eu nunca tinha visto. É cinza, tem os olhos vermelhos e um diferencial inconfundível: uma pena branca, alongada, na cabeça. Seu corpo é compacto, a penugem lisa, e não fosse pelas longas pernas e asas, passaria fácil fácil por um pinguim.
Não contente em atormentar minha curiosidade, um deles começou a me provocar. É aparentemente o maior deles, o macho alfa ou coisa do tipo. Passou a se exibir sobre uma pedra naquele lago maior da parte central do parque, e posso jurar que certa vez me encarou e soltou um grunhido, abafado pelas guitarras do Black Rebel Motorcycle Club no meu fone de ouvido.
Um belo dia, munido de minha imponente máquina fotográfica, resolvi registrar um pouco mais dos hábitos desta intrigante ave. Pela manhã, ela vai nos lagos do Curupira em busca de peixes. E haja paciência. Olha, entra na água, brinca de estátua, voa de uma margem para outra e demora pacas para pegar um singelo peixe. Seus ancestrais devem ser praticantes do zen-budismo. E adoram um sashimi.
Embora tenha uma vasta experiência com documentários, jamais vira aquela ave no Discovery, National Geographic ou Animal Planet. Recorri ao oráculo de nossos tempos: o Google. Digitei "pássaro cinza com pena branca alongada na cabeça", mas não obtive sucesso.
Conheci, no entanto, o site Wiki Aves - acredito que o nome seja autoexplicativo. Mas lá também era impossível encontrar o pássaro, diante de tantas opções e tão poucas informações que eu tinha a respeito de meu objeto de admiração. A solução foi enviar um e-mail para o administrador do site, Reinaldo Guedes. Anexei duas fotos e passei uma descrição básica do bicho.
Alguns dias se passaram, nada de resposta. Animado, cheguei a cogitar que tivesse descoberto, quem sabe?, uma nova espécie. Imaginei o chefe do Wiki Aves abrindo meu e-mail, exclamando um "oh, meu Deus!" e apertando o botão vermelho que aciona a mais alta cúpula zoológica brasileira para uma reunião de urgência. Visualizei a mim mesmo recebendo uma medalha ou coisa que o valha da Sociedade Nacional de Ornitologia.
Não foi o caso. Finalmente, o e-mail foi respondido.
Prezado Luis Fernando,
Trata-se de um savacu:
http://www.wikiaves.com.br/savacu
Atenciosamente,
Reinaldo Guedes
Devo confessar que o tom do e-mail não me agradou: mostra um certo desleixo, como alguém que diz "ora, meu filho, isso é só um savacu! não me encha o saco!" Mas não tive tempo para ficar com raiva. Estava muito feliz por finalmente poder dar um nome ao ponto de interrogação que sobrevoava minha cabeça há tanto tempo.
Eu juro que ali ele acabou de pegar um peixe!
Descobri que o savacu tem hábitos noturnos, também é conhecido por uma série de outros nomes (bem menos trocadilhescos, inclusive) e tem como principal "inimigo" os urubus.
Hoje vou mais tranquilo ao Curupira. Já não tenho aquela ansiedade de antes. Mas sempre que vejo as pessoas caminhando, imersas em seus pensamentos, preocupadas com a conta de luz e o IPVA, preciso me controlar para não cutucá-las e dizer: "ei, sabia que aquilo ali é um savacu?"
A ignorância é a felicidade. É o que dizem.
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Bônus: o Curupira é um lugar estranho. Em que outro ponto da face da terra uma árvore é capaz de atravessar um alambrado? Alguém explica?
26 de outubro de 2010
Um indiferente no reino de Melíndria
Era uma vez um reino muito distante chamado Melíndria.
Os melindrosos viviam em paz e harmonia. Todos eram sempre exageradamente gentis e educados, e ninguém andava pelas ruas imune a um "bom dia, como é especial sua existência para todos à nossa volta" ou a um "uau, que bonita sua roupa! Que roupinha mutcho louca!"
A diversão preferida dos melindrosos era gastar horas na Praça do Elogio Mútuo ou no Self-Promotion Shopping Center. Alguns habitantes, habilidosos com essas coisas de novas tecnologias, tinham até blogs, onde podiam expor, sem muito trabalho, seus cotidianos insignificantes e perfeitamente felizes. Eram devidamente reforçados por comentários incentivadores, jamais questionadores, o que dava à sociedade local uma interessante característica de bem-estar ad infinitum.
Como nem tudo é perfeito, e em toda história há um vilão, um belo dia surgiu em Melíndria um forasteiro, perdido, vindo do condado da Indiferência. Sua morada ficava bem longe do principado da Criticânia ou do reino da Acidézia, mas mesmo assim ele não foi muito recebido.
O rei foi vê-lo e saudou-o com um cordial aperto de mão. "Seja bem-vindo, nobre viajante! Aqui será muito bem tratado! Nos diga, já viste terra mais bela como esta?" No que o forasteiro respondeu: "Não sei". O rei estremeceu e soltou sua mão. A princesa pôs-se a chorar e recolheu-se a seus aposentos. O bobo da corte parou de pular. E todos viram que o aquele homem era diferente.
Os dias se seguiram, com os habitantes de Melíndria reagindo ora com indignação ora com profunda mágoa (sentimento que nunca haviam tido antes) diante das atitudes do forasteiro.
Até que o viajante foi fazer uma visita ao ferreiro. Precisava de uma ferradura, iria finalmente partir dali. "Vieste ao lugar certo! Usamos o mais poderoso metal, para fundir a mais brilhante ferradura! Me diga, o que achas?" Em vez de retribuir com um elogio, o que seria força de hábito a qualquer um ali, o forasteiro soltou um "ih, qualquer coisa aí tá bom".
Teve a cabeça cortada pela mais brilhante espada fundida pelo mais poderoso metal.
Melindre descobrira o ódio. E não permitiria mais visitas.
Os melindrosos viviam em paz e harmonia. Todos eram sempre exageradamente gentis e educados, e ninguém andava pelas ruas imune a um "bom dia, como é especial sua existência para todos à nossa volta" ou a um "uau, que bonita sua roupa! Que roupinha mutcho louca!"
A diversão preferida dos melindrosos era gastar horas na Praça do Elogio Mútuo ou no Self-Promotion Shopping Center. Alguns habitantes, habilidosos com essas coisas de novas tecnologias, tinham até blogs, onde podiam expor, sem muito trabalho, seus cotidianos insignificantes e perfeitamente felizes. Eram devidamente reforçados por comentários incentivadores, jamais questionadores, o que dava à sociedade local uma interessante característica de bem-estar ad infinitum.
Como nem tudo é perfeito, e em toda história há um vilão, um belo dia surgiu em Melíndria um forasteiro, perdido, vindo do condado da Indiferência. Sua morada ficava bem longe do principado da Criticânia ou do reino da Acidézia, mas mesmo assim ele não foi muito recebido.
O rei foi vê-lo e saudou-o com um cordial aperto de mão. "Seja bem-vindo, nobre viajante! Aqui será muito bem tratado! Nos diga, já viste terra mais bela como esta?" No que o forasteiro respondeu: "Não sei". O rei estremeceu e soltou sua mão. A princesa pôs-se a chorar e recolheu-se a seus aposentos. O bobo da corte parou de pular. E todos viram que o aquele homem era diferente.
Os dias se seguiram, com os habitantes de Melíndria reagindo ora com indignação ora com profunda mágoa (sentimento que nunca haviam tido antes) diante das atitudes do forasteiro.
Até que o viajante foi fazer uma visita ao ferreiro. Precisava de uma ferradura, iria finalmente partir dali. "Vieste ao lugar certo! Usamos o mais poderoso metal, para fundir a mais brilhante ferradura! Me diga, o que achas?" Em vez de retribuir com um elogio, o que seria força de hábito a qualquer um ali, o forasteiro soltou um "ih, qualquer coisa aí tá bom".
Teve a cabeça cortada pela mais brilhante espada fundida pelo mais poderoso metal.
Melindre descobrira o ódio. E não permitiria mais visitas.
15 de outubro de 2010
A preposição
Eis que um belo dia, no meu trabalho, me deparei com mais uma chamada de capa.
Aquele quadradinho maldito onde as palavras se espremem.
Naquele, especificamente, eu precisava colocar bastante coisa.
O "apertador" de palavras artificial do programa de diagramação não daria jeito.
Aflito, recorri ao menor dos vocábulos, o pai de todos, unanimidade na primeira verbete de qualquer dicionário: ela, a letra "a".
No caso, para desempenhar o papel de preposição (a letra "a" é uma grande atriz, vocês precisam ver): "A repórter do jornal, taxista tentou vender ponto por R$ 120 mil".
Escândalo! Absurdo! Cortem-no a cabeça!
E eu preocupado com o que iriam pensar do editorial...
Aquele quadradinho maldito onde as palavras se espremem.
Naquele, especificamente, eu precisava colocar bastante coisa.
O "apertador" de palavras artificial do programa de diagramação não daria jeito.
Aflito, recorri ao menor dos vocábulos, o pai de todos, unanimidade na primeira verbete de qualquer dicionário: ela, a letra "a".
No caso, para desempenhar o papel de preposição (a letra "a" é uma grande atriz, vocês precisam ver): "A repórter do jornal, taxista tentou vender ponto por R$ 120 mil".
Escândalo! Absurdo! Cortem-no a cabeça!
E eu preocupado com o que iriam pensar do editorial...
9 de outubro de 2010
Das coisas que eu odeio
Eu odeio frases que começam com "bom dia pra você que..." no twitter.
Eu odeio frases que começam com "gente que..." no twitter.
Eu odeio, de verdade e com todas as minhas forças, gente que escreve "ri alto" ou "ri litros", no twitter ou em qualquer lugar da face da Terra.
Eu odeio gente que, durante gols em jogos de futebol que passam na Globo, vão lá e tuítam: "gooooool..." ou, como se fosse muito diferente, "puta golaço".
Eu odeio o uso de verbos no imperativo com a terminação "ão": "leião", "vejão", "corrão". Puta merda, é tão difícil escrever corretamente? Eu ainda acho que esse tipo de coisa vai nos tornar uma nação de idiotas mais do que já somos.
Eu odeio quem dá RT em tuítes em inglês. Muito pior se o tuíte foi escrito por um brasileiro. Vai pros EUA ou Inglaterra, bonitão.
Acho que preciso fazer uma faxina na minha timeline.
Eu odeio frases que começam com "gente que..." no twitter.
Eu odeio, de verdade e com todas as minhas forças, gente que escreve "ri alto" ou "ri litros", no twitter ou em qualquer lugar da face da Terra.
Eu odeio gente que, durante gols em jogos de futebol que passam na Globo, vão lá e tuítam: "gooooool..." ou, como se fosse muito diferente, "puta golaço".
Eu odeio o uso de verbos no imperativo com a terminação "ão": "leião", "vejão", "corrão". Puta merda, é tão difícil escrever corretamente? Eu ainda acho que esse tipo de coisa vai nos tornar uma nação de idiotas mais do que já somos.
Eu odeio quem dá RT em tuítes em inglês. Muito pior se o tuíte foi escrito por um brasileiro. Vai pros EUA ou Inglaterra, bonitão.
Acho que preciso fazer uma faxina na minha timeline.
7 de outubro de 2010
Nick Drake e bolas de capotão
Nick Drake é esse cara aí embaixo.
Infelizmente, o século 21, sob o signo da banalização, criou uma tendência meio besta de definir tudo e qualquer coisa com o adjetivo "gênio".
Bom, esse cara aí é um. De verdade.
Para resumir, Nick Drake foi um puta de um músico fodido da Inglaterra que lançou três discos espetaculares que foram muito mal recebidos pela crítica e público de sua época. Não soube conviver com a frustração e, ainda não se sabe se intencionalmente ou não, morreu por overdose de antidepressivos aos 26 anos, em 1974.
Como naquela velha história de artistas que só são valorizados após sua morte, hoje o Nick Drake vem sendo cada vez mais lembrado e homenageado. Onze a cada dez artistas cool e indies do mundinho contemporâneo o citam como influência (ele deve se revirar no túmulo por isso).
Mas eu não vou me prolongar muito nisso porque o assunto do post é, na realidade, bolas de capotão.
É que ontem eu comprei uma réplica em tamanho reduzido (isso é redundância?) da Jabulani, a famosa bola da Copa. Tirei R$ 13 do bolso e comprei. Assim, pá-pum. E ganhei um bilhete grátis para uma sessão nostalgia.
Quando era criança, podem acreditar, minha brincadeira preferida era jogar bola. Videogame vinha em segundo lugar, e olhe lá. Eu vivia na rua. Até hoje não sei como minha mãe permitia uma barbaridade daquelas. Enfim.
Eu morava com minha família em um bairro meio classe-média baixa na periferia de Presidente Prudente, megalópole no Oeste Paulista, e de fato acho que éramos, digamos assim, um dos mais "ricos" ali da vizinhança. O que quero dizer é que eu meu pai, quando eu precisava, sempre me dava uma bola de futebol - eu tenho quase certeza que, feitas as devidas correções monetárias, elas eram bem mais baratas que a réplica da Jabulani.
As melhores eram as compradas no Bazar Aquariu's, de couro, onde meus olhos brilhavam ao ler termos como "costuradas à mão", "Fifa approved", "9.5 lbs" ou "official size and weight" (vai entender porque alguns termos eram em português e outros em inglês).
Eram as chamadas "bolas de capotão" - uma espécie intermediária entre a Dente de Leite (de borracha, muito leve, que com pouco tempo de uso ficava oval) e as profissionais (extremamente caras, muito duras e pesadas - uma vez ganhei uma da Topper, usada no Brasileirão de 1990, de Natal!).
Quando novas, assim como um sapato, uma calça jeans ou uma namorada, as bolas são bem desconfortáveis. Até você se acostumar, ela faz o pé arder (como o sapato), não se encaixa (como a calça) e é difícil de controlar (como a namorada). Mas quando você menos espera, lá está ela, macia, na textura ideal, pronta para viajar em chutes inacreditáveis, ser milagrosamente defendida por goleiros usando havaianas como luvas e explodir em traves imaginárias em muros de cimento chapiscado.
Com sorte, o relacionamento com uma bola de capotão pode durar bons meses. A "morte natural" de uma bola acontece depois dela perder os gomos de couro (fica só com a parte do tecido exposta), até que a costura abre e expõe a câmara de ar (fenômeno que eu e meus primos carinhosamente chamávamos de "câncer").
Aí, não tem jeito. Ou você encosta a bola e corre pro Bazar Aquariu's ou simplesmente espera a borracha da câmara de ar, pressionada pela costura, encontrar uma pedra ou espinho qualquer que alivie seu sofrimento.
Tragédias também podem acontecer: eu já perdi bolas atropeladas por caminhões (umas três que eu me lembre, pelo menos); furadas na ponta das lanças do portão da minha casa (era uma ótima bola, em processo de amaciamento ainda, até hoje não me perdoo); na torneira do hidrômetro ou para sempre soterradas nos meandros dos esgotos prudentinos (sério mesmo - se bem que eu acho que o cara que disse que era impossível entrar no bueiro entrou lá quando eu já tinha ido embora e ficou com a bola). Teve uma que um moleque roubou no campinho perto da Igreja. Meu pai conhecia o pai dele e o cara foi devolver, cheio de vergonha.
"Life is but a memory
Happened long ago
Theater full of sadness
For a long forgotten show
Seems so easy
Just to let it go on by
'Til you stop and wonder
Why you never wondered why?"
E isso é tudo o que eu tenho a dizer sobre isso.
(A frase é de Forrest Gump, um cara que conheceu muita gente e participou de muitos eventos históricos importantes. No entanto, não consta que ele tenha tido contato com Nick Drake ou jogado uma pelada com bola de capotão)
Infelizmente, o século 21, sob o signo da banalização, criou uma tendência meio besta de definir tudo e qualquer coisa com o adjetivo "gênio".
Bom, esse cara aí é um. De verdade.
Para resumir, Nick Drake foi um puta de um músico fodido da Inglaterra que lançou três discos espetaculares que foram muito mal recebidos pela crítica e público de sua época. Não soube conviver com a frustração e, ainda não se sabe se intencionalmente ou não, morreu por overdose de antidepressivos aos 26 anos, em 1974.
Como naquela velha história de artistas que só são valorizados após sua morte, hoje o Nick Drake vem sendo cada vez mais lembrado e homenageado. Onze a cada dez artistas cool e indies do mundinho contemporâneo o citam como influência (ele deve se revirar no túmulo por isso).
Mas eu não vou me prolongar muito nisso porque o assunto do post é, na realidade, bolas de capotão.
É que ontem eu comprei uma réplica em tamanho reduzido (isso é redundância?) da Jabulani, a famosa bola da Copa. Tirei R$ 13 do bolso e comprei. Assim, pá-pum. E ganhei um bilhete grátis para uma sessão nostalgia.
Quando era criança, podem acreditar, minha brincadeira preferida era jogar bola. Videogame vinha em segundo lugar, e olhe lá. Eu vivia na rua. Até hoje não sei como minha mãe permitia uma barbaridade daquelas. Enfim.
Eu morava com minha família em um bairro meio classe-média baixa na periferia de Presidente Prudente, megalópole no Oeste Paulista, e de fato acho que éramos, digamos assim, um dos mais "ricos" ali da vizinhança. O que quero dizer é que eu meu pai, quando eu precisava, sempre me dava uma bola de futebol - eu tenho quase certeza que, feitas as devidas correções monetárias, elas eram bem mais baratas que a réplica da Jabulani.
As melhores eram as compradas no Bazar Aquariu's, de couro, onde meus olhos brilhavam ao ler termos como "costuradas à mão", "Fifa approved", "9.5 lbs" ou "official size and weight" (vai entender porque alguns termos eram em português e outros em inglês).
Eram as chamadas "bolas de capotão" - uma espécie intermediária entre a Dente de Leite (de borracha, muito leve, que com pouco tempo de uso ficava oval) e as profissionais (extremamente caras, muito duras e pesadas - uma vez ganhei uma da Topper, usada no Brasileirão de 1990, de Natal!).
Quando novas, assim como um sapato, uma calça jeans ou uma namorada, as bolas são bem desconfortáveis. Até você se acostumar, ela faz o pé arder (como o sapato), não se encaixa (como a calça) e é difícil de controlar (como a namorada). Mas quando você menos espera, lá está ela, macia, na textura ideal, pronta para viajar em chutes inacreditáveis, ser milagrosamente defendida por goleiros usando havaianas como luvas e explodir em traves imaginárias em muros de cimento chapiscado.
Com sorte, o relacionamento com uma bola de capotão pode durar bons meses. A "morte natural" de uma bola acontece depois dela perder os gomos de couro (fica só com a parte do tecido exposta), até que a costura abre e expõe a câmara de ar (fenômeno que eu e meus primos carinhosamente chamávamos de "câncer").
Aí, não tem jeito. Ou você encosta a bola e corre pro Bazar Aquariu's ou simplesmente espera a borracha da câmara de ar, pressionada pela costura, encontrar uma pedra ou espinho qualquer que alivie seu sofrimento.
Tragédias também podem acontecer: eu já perdi bolas atropeladas por caminhões (umas três que eu me lembre, pelo menos); furadas na ponta das lanças do portão da minha casa (era uma ótima bola, em processo de amaciamento ainda, até hoje não me perdoo); na torneira do hidrômetro ou para sempre soterradas nos meandros dos esgotos prudentinos (sério mesmo - se bem que eu acho que o cara que disse que era impossível entrar no bueiro entrou lá quando eu já tinha ido embora e ficou com a bola). Teve uma que um moleque roubou no campinho perto da Igreja. Meu pai conhecia o pai dele e o cara foi devolver, cheio de vergonha.
"Life is but a memory
Happened long ago
Theater full of sadness
For a long forgotten show
Seems so easy
Just to let it go on by
'Til you stop and wonder
Why you never wondered why?"
E isso é tudo o que eu tenho a dizer sobre isso.
(A frase é de Forrest Gump, um cara que conheceu muita gente e participou de muitos eventos históricos importantes. No entanto, não consta que ele tenha tido contato com Nick Drake ou jogado uma pelada com bola de capotão)
30 de setembro de 2010
Novidade
Meu novo blog já está no ar.
http://testecego.blogspot.com
Dêem uma olhada. E, se gostarem, divulguem.
http://testecego.blogspot.com
Dêem uma olhada. E, se gostarem, divulguem.
24 de setembro de 2010
Porque eu não gosto dos críticos
Vou contar um segredo.
Quando eu tinha acabado de me formar, queria trabalhar com jornalismo musical. Até emplaquei algumas coisinhas nesta área aqui e ali, até que um belo dia a realidade bateu à minha porta e eu caí no jornalismo diário (hoje, sei que foi a melhor coisa que poderia ter me acontecido).
Numa entrevista recente à revista Piauí, o jornalista e cineasta Luiz Carlos Barreto disse que, antigamente, jornalistas iniciavam a carreira na porta da delegacia. Hoje, o fazem escrevendo resenhas de discos e filmes. É a sentença que exemplifica boa parte do declínio da atividade de jornalista nos dias que correm - e deveria ser levada como um mantra (e um tapa na cara) por boa parte de nossos imberbes coleguinhas.
Nesses dias, eu tô numas de ouvir o "With Teeth", disco do Nine Inch Nails de 2005. Desde aquele ano já gosto do disco, e desde lá venho o ouvindo com certa constância. Mas só agora descobri a música "Beside You in Time", que para mim se juntou a outras (do disco, do NIN e de todos os tempos) como uma das mais fodidas que conheço. Cinco anos depois!
Com outros discos, coisas como essas acontecem o tempo todo. Um barulhinho aqui, outro ali que nunca foram percebidos; ou simplesmente passamos a ouvir determinada música de forma diferente de acordo com nosso humor, estado de espírito ou mudança de visão a respeito das coisas.
Por essas e por outras, me desculpem, mas eu não consigo acreditar que algum ser humano consiga analisar um disco, esmiuçar suas nuances e contextualizá-lo num período histórico-cultural em uma, duas ou, vá lá, três audições. Porque, vocês sabem, o jornalismo é velocidade (ainda mais com a internet, blogs e etc): publicar primeiro é o que vale mais. Conteúdo é o de menos.
O processo todo também é muito injusto com o artista. O cara (dependendo do cara, é evidente) vai lá, escreve as letras, reescreve, elabora a harmonia, os arranjos, às vezes bola um conceito todo fechadinho pro disco, grava, regrava, vai o produtor e amarra tudo: deve ser uma coisa meio desgastante. Repito, pra quem é ARTISTA DE VERDADE.
Aí vai um filho da puta que ganhou o CD de jabá no conforto da sua redação e desce a lenha porque tomou café demais e a gastrite dele gritou. Ou porque levou um pé na bunda da estagiária que estava comendo.
Ou, do contrário: às vezes o cara recebe uma merdinha produzida às pressas para pegar carona no sucesso de alguém que lançou moda, o material vem embrulhado em um belo pacote, com brinde e tudo, fica difícil falar mal.
Sacaram meu ponto? Tudo bem, a crítica tem mesmo que ser subjetiva, mas minha opinião é que essa subjetividade não pode ser "controlada". Você pode ser o crítico mais estudado, íntegro e imparcial do mundo, mas é um ser humano, e qualquer coisa pode influenciar em sua análise.
Inclusive, e principalmente, seu gosto. Infelizmente, muitos críticos, no alto de seus egos, confundem "eu gosto" com "isso é bom" e "não gosto" com "isso é uma merda" e, baseados nisso, fazem suas análises.
Eu mesmo, por exemplo, não gosto de U2. Uma coisinha aqui, outra ali, mas não é uma banda da qual eu compraria (ou baixaria) discos. Não me agrada, ué. Só que eu respeito, e até admiro, pela importância histórica para a música pop, para a indústria do entretenimento e tal.
Não é porque eu não gosto que vou ficar arrumando argumentos para esculachar com os caras. É uma linha muito tênue: muita gente diz "essa música é uma merda", quando o mais correto, ao meu ver, seria dizer "PARA MIM, essa música é uma merda." Faz toda a diferença.
Enfim, falei demais e este é mais um post que ninguém vai ler.
Vou ali ouvir Nine Inch Nails. E procurar uma boa crítica do "With Teeth" para ler.
Quando eu tinha acabado de me formar, queria trabalhar com jornalismo musical. Até emplaquei algumas coisinhas nesta área aqui e ali, até que um belo dia a realidade bateu à minha porta e eu caí no jornalismo diário (hoje, sei que foi a melhor coisa que poderia ter me acontecido).
Numa entrevista recente à revista Piauí, o jornalista e cineasta Luiz Carlos Barreto disse que, antigamente, jornalistas iniciavam a carreira na porta da delegacia. Hoje, o fazem escrevendo resenhas de discos e filmes. É a sentença que exemplifica boa parte do declínio da atividade de jornalista nos dias que correm - e deveria ser levada como um mantra (e um tapa na cara) por boa parte de nossos imberbes coleguinhas.
Nesses dias, eu tô numas de ouvir o "With Teeth", disco do Nine Inch Nails de 2005. Desde aquele ano já gosto do disco, e desde lá venho o ouvindo com certa constância. Mas só agora descobri a música "Beside You in Time", que para mim se juntou a outras (do disco, do NIN e de todos os tempos) como uma das mais fodidas que conheço. Cinco anos depois!
Com outros discos, coisas como essas acontecem o tempo todo. Um barulhinho aqui, outro ali que nunca foram percebidos; ou simplesmente passamos a ouvir determinada música de forma diferente de acordo com nosso humor, estado de espírito ou mudança de visão a respeito das coisas.
Por essas e por outras, me desculpem, mas eu não consigo acreditar que algum ser humano consiga analisar um disco, esmiuçar suas nuances e contextualizá-lo num período histórico-cultural em uma, duas ou, vá lá, três audições. Porque, vocês sabem, o jornalismo é velocidade (ainda mais com a internet, blogs e etc): publicar primeiro é o que vale mais. Conteúdo é o de menos.
O processo todo também é muito injusto com o artista. O cara (dependendo do cara, é evidente) vai lá, escreve as letras, reescreve, elabora a harmonia, os arranjos, às vezes bola um conceito todo fechadinho pro disco, grava, regrava, vai o produtor e amarra tudo: deve ser uma coisa meio desgastante. Repito, pra quem é ARTISTA DE VERDADE.
Aí vai um filho da puta que ganhou o CD de jabá no conforto da sua redação e desce a lenha porque tomou café demais e a gastrite dele gritou. Ou porque levou um pé na bunda da estagiária que estava comendo.
Ou, do contrário: às vezes o cara recebe uma merdinha produzida às pressas para pegar carona no sucesso de alguém que lançou moda, o material vem embrulhado em um belo pacote, com brinde e tudo, fica difícil falar mal.
Sacaram meu ponto? Tudo bem, a crítica tem mesmo que ser subjetiva, mas minha opinião é que essa subjetividade não pode ser "controlada". Você pode ser o crítico mais estudado, íntegro e imparcial do mundo, mas é um ser humano, e qualquer coisa pode influenciar em sua análise.
Inclusive, e principalmente, seu gosto. Infelizmente, muitos críticos, no alto de seus egos, confundem "eu gosto" com "isso é bom" e "não gosto" com "isso é uma merda" e, baseados nisso, fazem suas análises.
Eu mesmo, por exemplo, não gosto de U2. Uma coisinha aqui, outra ali, mas não é uma banda da qual eu compraria (ou baixaria) discos. Não me agrada, ué. Só que eu respeito, e até admiro, pela importância histórica para a música pop, para a indústria do entretenimento e tal.
Não é porque eu não gosto que vou ficar arrumando argumentos para esculachar com os caras. É uma linha muito tênue: muita gente diz "essa música é uma merda", quando o mais correto, ao meu ver, seria dizer "PARA MIM, essa música é uma merda." Faz toda a diferença.
Enfim, falei demais e este é mais um post que ninguém vai ler.
Vou ali ouvir Nine Inch Nails. E procurar uma boa crítica do "With Teeth" para ler.
12 de setembro de 2010
Doença
(...)
"Ser marido é como ter uma doença crônica, mas perfeitamente administrável, uma vez que você esteja ciente de sua condição. (...) Comendo direito, praticando exercícios físicos e tomando alguns outros cuidados para amenizar os sintomas, ninguém poderá apontá-lo no meio da multidão e dizer: lá vai um marido."
"(...) descobrir a doença logo no início é a única forma de evitar a piora do quadro, que pode levar à obesidade, uso de chinelos com meia, surdez eletiva, obsessão por piadas infames, trocadilhos pífios, catatonia e, em alguns casos, ao divórcio."
Sério, todo mundo tem que ler o texto inteiro.
Ouso dizer que Antonio Prata é melhor que o pai dele. Faz tempo.
"Ser marido é como ter uma doença crônica, mas perfeitamente administrável, uma vez que você esteja ciente de sua condição. (...) Comendo direito, praticando exercícios físicos e tomando alguns outros cuidados para amenizar os sintomas, ninguém poderá apontá-lo no meio da multidão e dizer: lá vai um marido."
"(...) descobrir a doença logo no início é a única forma de evitar a piora do quadro, que pode levar à obesidade, uso de chinelos com meia, surdez eletiva, obsessão por piadas infames, trocadilhos pífios, catatonia e, em alguns casos, ao divórcio."
Sério, todo mundo tem que ler o texto inteiro.
Ouso dizer que Antonio Prata é melhor que o pai dele. Faz tempo.
11 de setembro de 2010
Fábula
Me contaram uma piada:
Um homem vai ao médico. Diz que está deprimido. Que a vida parece dura e cruel.
Conta que se sente só num mundo ameaçador, onde o que se anuncia é vago e incerto.
O médico diz: "O tratamento é simples. O grande palhaço Pagliacci está na cidade esta noite. Vá ao show. Isso deve animar você".
O homem se desfaz em lágrimas.
E diz: "Mas doutor... Eu sou o Pagliacci".
(Alan Moore, "Watchmen", capítulo II, págs. 67-68)
Um homem vai ao médico. Diz que está deprimido. Que a vida parece dura e cruel.
Conta que se sente só num mundo ameaçador, onde o que se anuncia é vago e incerto.
O médico diz: "O tratamento é simples. O grande palhaço Pagliacci está na cidade esta noite. Vá ao show. Isso deve animar você".
O homem se desfaz em lágrimas.
E diz: "Mas doutor... Eu sou o Pagliacci".
(Alan Moore, "Watchmen", capítulo II, págs. 67-68)
1 de setembro de 2010
A menina do piano
O nome dela é Vika Yermolyeva, ela vive em Amsterdã, na Holanda; tem um site, um canal no Youtube, um perfil no Twitter.
Ela toca piano.
Música é esquisita: a gente sempre se guia por algum estilo, mas na verdade nunca sabe porque gosta desse ou daquele. E, no caso dessa menina, eu não sei se gosto mais das versões no piano para músicas pop (no site dela ela define sua música como "Metal Music Covered On Piano") ou se aprecio o fato de alguém saber transpor essas canções para o instrumento.
O que, junto com a admiração, me traz um enorme sentimento de inveja.
Quisera eu pegar meu violão e sair tocando assim as músicas que gosto. Mal consigo tocar pegando as cifras na internet; quando tem um riff que quero aprender desisto na segunda tentativa. E o que era para ser diversão se torna um repetitivo exercício de frustração.
Enfim, pra quem gosta de covers como eu, ou pra quem gosta de músicas do Nirvana, Nine Inch Nails, Radiohead, Metallica, Guns and Roses e de muitas outras, eu recomendo a visita ao site dela e ao perfil no Youtube. No site, dá pra baixar tudo em mp3.
Ela toca piano.
Música é esquisita: a gente sempre se guia por algum estilo, mas na verdade nunca sabe porque gosta desse ou daquele. E, no caso dessa menina, eu não sei se gosto mais das versões no piano para músicas pop (no site dela ela define sua música como "Metal Music Covered On Piano") ou se aprecio o fato de alguém saber transpor essas canções para o instrumento.
O que, junto com a admiração, me traz um enorme sentimento de inveja.
Quisera eu pegar meu violão e sair tocando assim as músicas que gosto. Mal consigo tocar pegando as cifras na internet; quando tem um riff que quero aprender desisto na segunda tentativa. E o que era para ser diversão se torna um repetitivo exercício de frustração.
Enfim, pra quem gosta de covers como eu, ou pra quem gosta de músicas do Nirvana, Nine Inch Nails, Radiohead, Metallica, Guns and Roses e de muitas outras, eu recomendo a visita ao site dela e ao perfil no Youtube. No site, dá pra baixar tudo em mp3.
24 de agosto de 2010
Curtas
Qual é a lógica em fazer um empanado de frango em forma de bolinhas e chamá-lo de "pipoca"?
***
Um de meus melhores amigos eu conheci na 3a. série. Depois ele mudou de cidade e nunca mais tivemos contato.
***
Um defeito no meu violão me impede de tocar qualquer música que use a mizinha, da 3a. a 6a. casa. O que inclui, especialmente, "Losing my Religion" e "High and Dry". "Smells Like Teen Spirit" continua uma beleza.
***
Eu gosto de pudim de leite condensado.
***
A vida é um confronto constante com perdas, frustrações e decepções. A felicidade aparece quando a gente ganha.
***
Como diz um amigo, japonês é mesmo esperto: faz comida sem usar fogão e mesmo assim ainda consegue cobrar mais caro.
***
"Deixa eu entender isso direito", disse um aluno. "Você está me dizendo que, se eu disser uma coisa em voz alta, sou eu dizendo, mas se eu escrever exatamente a mesma coisa no papel, é de outra pessoa, certo?"
"Sim", eu respondi. "E nós estamos chamando isso de ficção."
O aluno sacou seu caderno, escreveu algo e me passou uma folha de papel que dizia: "Isso é a porra mais idiota que já ouvi na vida."
Era um grupo esperto.
(David Sedaris, "Eu falar bonito um dia", Cia. das Letras, 2008)
***
Este blog não segue as normas da ABNT para citações.
***
Um de meus melhores amigos eu conheci na 3a. série. Depois ele mudou de cidade e nunca mais tivemos contato.
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Um defeito no meu violão me impede de tocar qualquer música que use a mizinha, da 3a. a 6a. casa. O que inclui, especialmente, "Losing my Religion" e "High and Dry". "Smells Like Teen Spirit" continua uma beleza.
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Eu gosto de pudim de leite condensado.
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A vida é um confronto constante com perdas, frustrações e decepções. A felicidade aparece quando a gente ganha.
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Como diz um amigo, japonês é mesmo esperto: faz comida sem usar fogão e mesmo assim ainda consegue cobrar mais caro.
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"Deixa eu entender isso direito", disse um aluno. "Você está me dizendo que, se eu disser uma coisa em voz alta, sou eu dizendo, mas se eu escrever exatamente a mesma coisa no papel, é de outra pessoa, certo?"
"Sim", eu respondi. "E nós estamos chamando isso de ficção."
O aluno sacou seu caderno, escreveu algo e me passou uma folha de papel que dizia: "Isso é a porra mais idiota que já ouvi na vida."
Era um grupo esperto.
(David Sedaris, "Eu falar bonito um dia", Cia. das Letras, 2008)
***
Este blog não segue as normas da ABNT para citações.
21 de agosto de 2010
A página de mundo
Um belo dia, no meu trabalho, me vi responsável pela página de mundo. Demorou um pouquinho, mas depois eu descobri que gosto disso. É legal ser o cara que, teoricamente, "resume o mundo" em uma página (a despeito de qualquer presunção, por favor - este é o meu trabalho, então melhor vê-lo dessa forma que reduzi-lo a nada).
Mas - e não sei bem o porquê - eu tenho a infeliz impressão de que ninguém lê aquele troço. Se for mesmo verdade, é uma pena, porque não é uma tarefa tão simples assim.
Primeira dificuldade: definir o abre. Tem tanta coisa acontecendo no mundo, como saber o que é o mais importante? Uma rápida olhada pelos principais portais da internet pode dar uma boa ideia da "agenda" do dia, mas o destaque dos sites pode ser ardiloso, e nem sempre o que é manchete às 15h será o assunto principal do dia seguinte.
A não ser quando você bate o olho na notícia e ela te diz: "pode parar de escolher, querido. Sou eu que você quer". Aí tudo fica mais fácil. Mas isso você só aprende a identificar com um certo tempo: se estiver na dúvida, um outro bom termômetro, até com certo apreço científico, é botar o tema no Google, buscar por "notícias" e ver quantas agências estão cobrindo o assunto. Mas isso não pode ser o modus operandi do fechamento, se não você fica preguiçoso e nunca vai aprender a hieararquizar notícia.
E, afinal, não se trata apenas de identificar qual é o tema mais comentado, mas sim qual seria o mais interessante para os leitores.
Definido o abre, tem que ver se tem foto na agência contratada pelo jornal. Não tem? Se o assunto merecer, usa arquivo. Se não for algo tão pulsante assim, é o caso de repensar e talvez buscar outra solução. Uma boa foto pode ser mais legal que o texto (a velha história da imagem valer por mil palavras), e muitas vezes o abre é o único lugar da página onde vai foto.
Se tiver bastante opção de imagem, toca pra escolher uma. Que seja boa, que caiba no corte, mas que não seja a melhor de todas (essa fica para o caso do chefe querer usar na capa). Na hora de editar o texto, começa a briga com o espaço e com os códigos às vezes indecifráveis das agências internacionais. É cada tijolo que vem que vocês não têm ideia. Coisas como: "O presidente dos EUA, Barack Obama, decidiu que vai manter o plano de retirada das tropas do Iraque para 31 de agosto. 'Vou manter o plano de retirada das tropas para 31 de agosto', disse Obama". Haja saco.
Cortado o texto, hora de fazer o título. Espaço pequeno, quase impossível manter a velha fórmula "alguém-faz-alguma-coisa". Bora tentar um trocadilho, uma ironia (se não for tragédia ou algo envolvendo gente morta, pode). Opa, deu. Mas esse o chefe não vai gostar... Algo mais simples. Agora sim. Mas e se o leitor não entender? Ler o título e passar reto pela página? Ah, a foto é boa, então o título não precisa ser tão atrativo. Ih, a foto é só um boneco? Melhor caprichar mais. Bota a cabeça pra funcionar, é pra isso que você é pago.
Abre fechado, hora de fazer as outras seis notas (sendo duas com foto, isso no modelo-padrão mais usado pelo jornal). São notas pequenas, mas não importa: são seis assuntos diferentes, e o tamanho só torna o trabalho de edição mais complicado. É triste resumir, por exemplo, uma revolta popular provocada por anos de ditadura em um país africano, toda a história de um povo, em 15 linhas.
Hora de distribuir o mundo na página. O abre é o quê? Oriente médio? Então já tá bom pra eles. Talvez mais uma nota se tiver alguma coisa muito boa (SEMPRE vai ter notícia de Israel, Iraque e Irã). Merece mais que isso, mas são só seis assuntos, e ainda tem um mundo inteiro para mostrar. Tem algo sobre alguma das guerras dos EUA? É bom ter. Mas não vale placar de cadáveres no Iraque ou no Afeganistão. Tem Europa? Ásia (Coreias ou China)?
América do Sul. Essa sempre tem que ter. São nossos vizinhos. Mas aí tem um problema: meu horário de fechamento é muito cedo, e as notícias de Venezuela, Colômbia e afins só pipocam no fim da tarde. Quase nunca entra nada quente. Só "recupera" do dia anterior. Paciência.
Brasileiro fez cagada no estrangeiro? Lula discursou na ONU, apertou as mãos de alguém lá fora ou meteu o bedelho onde não foi chamado? Brasil foi destaque (positivo ou negativo) em algum megalevantamento de alguma megaorganização internacional? Obrigação noticiar.
Droga, e as notas com foto? Quais são as tragédias da vez? Incêndios na Rússia, deslizamentos de terra na China, enchentes no Paquistão. Fotos espetaculares ao monte. Mas precisa ver qual é a notícia; como as fotos são inferiores ao abre já não vale a regra de dar só pela imagem. Alguma tragédia pontual? Algum avião caiu? Algum touro invadiu a arquibancada de um festival qualquer na Espanha? Um atirador maluco matou os amigos da escola e se matou?
Se sim, está feito. Se não, fodeu: vai ter que cagar sangue para escolher um assunto "fotável", ou então usar um tema bom e pegar foto de arquivo. Ou, ainda, usar a velha fórmula "autoridade-diz-que...". Sempre tem foto de alguém falando alguma coisa ao redor do planeta. Escolhe a foto, joga lá. Qual o crédito? Eita nome complicado de fotógrafo, melhor copiar e colar para não errar.
Editadas as notas, feitos os títulos, jogadas as fotos, hora de dar uma "panorâmica" pela página. É sempre bom que os títulos não repitam palavras (com exceção de artigos e pronomes); que as fotos não "olhem" para o lado de fora de página; que a "composição estética", de forma geral, esteja bacana. Mas como eu vejo isso? Se vira, cara! Não sabe diferenciar o feio do bonito?
Tudo equilibrado? Abre para o oriente médio; notas sobre guerra no topo, do lado direito; tragédia social em uma foto debaixo; eleições na Austrália na outra; Chávez e Colômbia no meio da página; Fidel também; Coreia no pé, do lado do calor infernal na Europa.
Nada para refazer. Uma página já foi. Faltam 23.
Mas - e não sei bem o porquê - eu tenho a infeliz impressão de que ninguém lê aquele troço. Se for mesmo verdade, é uma pena, porque não é uma tarefa tão simples assim.
Primeira dificuldade: definir o abre. Tem tanta coisa acontecendo no mundo, como saber o que é o mais importante? Uma rápida olhada pelos principais portais da internet pode dar uma boa ideia da "agenda" do dia, mas o destaque dos sites pode ser ardiloso, e nem sempre o que é manchete às 15h será o assunto principal do dia seguinte.
A não ser quando você bate o olho na notícia e ela te diz: "pode parar de escolher, querido. Sou eu que você quer". Aí tudo fica mais fácil. Mas isso você só aprende a identificar com um certo tempo: se estiver na dúvida, um outro bom termômetro, até com certo apreço científico, é botar o tema no Google, buscar por "notícias" e ver quantas agências estão cobrindo o assunto. Mas isso não pode ser o modus operandi do fechamento, se não você fica preguiçoso e nunca vai aprender a hieararquizar notícia.
E, afinal, não se trata apenas de identificar qual é o tema mais comentado, mas sim qual seria o mais interessante para os leitores.
Definido o abre, tem que ver se tem foto na agência contratada pelo jornal. Não tem? Se o assunto merecer, usa arquivo. Se não for algo tão pulsante assim, é o caso de repensar e talvez buscar outra solução. Uma boa foto pode ser mais legal que o texto (a velha história da imagem valer por mil palavras), e muitas vezes o abre é o único lugar da página onde vai foto.
Se tiver bastante opção de imagem, toca pra escolher uma. Que seja boa, que caiba no corte, mas que não seja a melhor de todas (essa fica para o caso do chefe querer usar na capa). Na hora de editar o texto, começa a briga com o espaço e com os códigos às vezes indecifráveis das agências internacionais. É cada tijolo que vem que vocês não têm ideia. Coisas como: "O presidente dos EUA, Barack Obama, decidiu que vai manter o plano de retirada das tropas do Iraque para 31 de agosto. 'Vou manter o plano de retirada das tropas para 31 de agosto', disse Obama". Haja saco.
Cortado o texto, hora de fazer o título. Espaço pequeno, quase impossível manter a velha fórmula "alguém-faz-alguma-coisa". Bora tentar um trocadilho, uma ironia (se não for tragédia ou algo envolvendo gente morta, pode). Opa, deu. Mas esse o chefe não vai gostar... Algo mais simples. Agora sim. Mas e se o leitor não entender? Ler o título e passar reto pela página? Ah, a foto é boa, então o título não precisa ser tão atrativo. Ih, a foto é só um boneco? Melhor caprichar mais. Bota a cabeça pra funcionar, é pra isso que você é pago.
Abre fechado, hora de fazer as outras seis notas (sendo duas com foto, isso no modelo-padrão mais usado pelo jornal). São notas pequenas, mas não importa: são seis assuntos diferentes, e o tamanho só torna o trabalho de edição mais complicado. É triste resumir, por exemplo, uma revolta popular provocada por anos de ditadura em um país africano, toda a história de um povo, em 15 linhas.
Hora de distribuir o mundo na página. O abre é o quê? Oriente médio? Então já tá bom pra eles. Talvez mais uma nota se tiver alguma coisa muito boa (SEMPRE vai ter notícia de Israel, Iraque e Irã). Merece mais que isso, mas são só seis assuntos, e ainda tem um mundo inteiro para mostrar. Tem algo sobre alguma das guerras dos EUA? É bom ter. Mas não vale placar de cadáveres no Iraque ou no Afeganistão. Tem Europa? Ásia (Coreias ou China)?
América do Sul. Essa sempre tem que ter. São nossos vizinhos. Mas aí tem um problema: meu horário de fechamento é muito cedo, e as notícias de Venezuela, Colômbia e afins só pipocam no fim da tarde. Quase nunca entra nada quente. Só "recupera" do dia anterior. Paciência.
Brasileiro fez cagada no estrangeiro? Lula discursou na ONU, apertou as mãos de alguém lá fora ou meteu o bedelho onde não foi chamado? Brasil foi destaque (positivo ou negativo) em algum megalevantamento de alguma megaorganização internacional? Obrigação noticiar.
Droga, e as notas com foto? Quais são as tragédias da vez? Incêndios na Rússia, deslizamentos de terra na China, enchentes no Paquistão. Fotos espetaculares ao monte. Mas precisa ver qual é a notícia; como as fotos são inferiores ao abre já não vale a regra de dar só pela imagem. Alguma tragédia pontual? Algum avião caiu? Algum touro invadiu a arquibancada de um festival qualquer na Espanha? Um atirador maluco matou os amigos da escola e se matou?
Se sim, está feito. Se não, fodeu: vai ter que cagar sangue para escolher um assunto "fotável", ou então usar um tema bom e pegar foto de arquivo. Ou, ainda, usar a velha fórmula "autoridade-diz-que...". Sempre tem foto de alguém falando alguma coisa ao redor do planeta. Escolhe a foto, joga lá. Qual o crédito? Eita nome complicado de fotógrafo, melhor copiar e colar para não errar.
Editadas as notas, feitos os títulos, jogadas as fotos, hora de dar uma "panorâmica" pela página. É sempre bom que os títulos não repitam palavras (com exceção de artigos e pronomes); que as fotos não "olhem" para o lado de fora de página; que a "composição estética", de forma geral, esteja bacana. Mas como eu vejo isso? Se vira, cara! Não sabe diferenciar o feio do bonito?
Tudo equilibrado? Abre para o oriente médio; notas sobre guerra no topo, do lado direito; tragédia social em uma foto debaixo; eleições na Austrália na outra; Chávez e Colômbia no meio da página; Fidel também; Coreia no pé, do lado do calor infernal na Europa.
Nada para refazer. Uma página já foi. Faltam 23.
15 de agosto de 2010
Teste cego da cerveja
Prólogo
Eu não entendo muita coisa de cerveja. Só sei que gosto de tomá-las, assim, de vez em quando, em casa, na hora de fazer comida ou para ver o futebol, ou ainda no bar com os amigos.
Acontece que, quando estou no supermercado diante das gôndolas destinadas à bebida preferida dos brasileiros, nunca sei que marca levar para casa. Ao contrário de alguns amigos, que sempre têm uma opinião muito bem formada sobre o assunto: "Skol é cerveja de menina ou de boyzinho na balada", "Brahma é que é cerveja de macho", "Antarctica? Se não for de Agudos, é grave", e por aí vai.
Por isso, sempre acabo recorrendo às marcas que eu ACHO que são as melhores, baseado nas opiniões desses mesmos amigos ou, porque não, do bom e velho marketing. É fato que que quem anuncia mais (e melhor) tem mais poder. E a gente sempre acaba sendo influenciado. Fora o poderosíssimo "imaginário popular", né? "Kaiser tem gosto de remédio", "Nova Schin é mijo", e etc.
Eu precisava tirar isso a limpo. Para dirimir minhas dúvidas na hora de escolher a cerveja certa diante de tantas opções. Para poder beber determinada marca sem culpa naquele churrasco com a família. Ou, ainda, para ter bons elementos na hora de criticar a cerveja que seu amigo trouxe para casa no fardinho com 12 unidades para aquela festinha.
Claro que se pudesse eu só comprava cerveja importada. Mas não posso. Por isso, fiz um teste cego entre as "bambambans" nacionais, as mais fáceis de encontrar, as que todo mundo toma. Acho que é forma mais justa de decidir, já que supostamente o que deveria interessar em uma cerveja é seu sabor.
Os critérios
Escolhi seis marcas que penso serem as mais populares do País: Antarctica, Brahma, Skol, Nova Schin, Kaiser e Itaipava. Excluí marcas como a Bohemia, que tem qualidade sabidamente superior, e outras mais novas no mercado ou muito mais baratas, destinadas a outros públicos. Também excluí marcas que não possuem versões em lata.
Para o teste, usei uma venda, e minha querida mulher Priscila (que mostra, como sempre, ser uma esposa exemplar, me apoiando até mesmo nesse tipo de bobagem) enumerou as cervejas em uma ordem da qual só ela sabia. À medida que eu fazia as "degustações", anotava minhas impressões.
Resolvi avaliar a textura (se é muito líquida ou mais cremosa) e "índice de amargor" (em níveis que vão de 1 a 5), além dos sabores contidos na cerveja.
Entre uma marca e outra, comi um aperitivo, e pela primeira vez na vida pude realmente compreender o sentido da expressão "tira-gosto". O aperitivo não terá sua marca divulgada porque este blog não ganhará nada por isso. Basta dizer que se trata de uma conhecida marca de batata-frita que antes custava o olho da cara mas que agora está com o preço mais acessível e pode ser até comprada de vez em quando, cujo sabor é espetacular!
Vamos lá?
O teste
Em ordem de desgustação:
Número 1 (não é a Brahma) - Nova Schin
Textura nível 5 (muito cremosa), o que para mim é bem bacana. Amargor nível 3 (tá bom assim), mas pecou nos sabores: no final do gole, aparece alguma coisa estranha, como... madeira? Difícil definir pra quem não é enólogo, barista ou afim.
Número 2 - Brahma
Textura nível 3 (bom, mas poderia ser melhor), amargor nível 4 (eita ferro!), com sabor bastante uniforme, sem alterações durante a degustação. Uma cerveja bem na média, mas meio amarga demais para meu gosto.
Número 3 - Kaiser
Textura nível 4 (cremosinha), amargor nível 3 (tá bom assim), com sabor também bastante uniforme. Como é um pouco mais suave, para mim levou vantagem sobre a concorrente nº 2. Nas minhas anotações, escrevi: "até agora a melhor".
Número 4 - Antarctica
Textura nível 5 (muito cremosa), amargor nível 3 (tá bom assim) e sabor uniforme, sem surpresas. Ganha das demais analisadas até então por ser um pouco mais cremosa.
Número 5 - Itaipava
Textura nível 4 (cremosinha), amargor nível 2,75 (suave como tem que ser). Foi a que apresentou a maior complexidade de sabores: meio frutada, além de deixar um "rastro" bastante agradável depois do gole.
Número 6 - Skol
Textura nível 2,5 (parece água), amargor nível 3 (tá bom assim), mas com uma nota no sabor MUITO estranha. Algo que me remeteu a... peixe. É, é isso, fazer o quê? Você pode me chamar de maluco, mas não é o que eu espero encontrar em uma cerveja.
Chorinho
Droga, quem comprou Bavaria?
A escolhida
Durante as degustações, eu não tinha nenhuma pista de que marca estava tomando. Quando terminei, a melhor estava evidente.
Eu me surpreendi bastante. Itaipava passa longe das minhas preferências na hora da compra, e olha que eu já tive amigos me dizendo: "só compro Itaipava", "Itaipava é muito boa". E eu pensava: "nossa, esse aí não entende bosta nenhuma de cerveja."
Paguei com a boca, literalmente.
Se fosse fazer um ranking, ficaria assim:
1 - Itaipava
2 - Antarctica
3 - Kaiser
4 - Brahma
5 - Nova Schin
6 - Skol
Conclusão
É importante dizer que tudo o que foi dito aqui é estritamente SUBJETIVO. Eu não sou "cervejólogo" e nem quis descobrir qual é a melhor cerveja do Brasil (quem sou eu pra definir uma coisa dessas?). Quis apenas escolher a melhor cerveja PARA MIM, e compartilhar todo o processo neste humilde blog.
No fim das contas, acho que a lição que fica mesmo é que paladar cada um tem o seu, assim como gosto para determinado tipo de música ou cor de camiseta. E isso deve ser respeitado, oras. Pode ser que eu ouça de alguém: "Itaipava? Tá maluco? Boa mesmo é a Skol"; com a diferença de que agora poderei responder "maluco é você".
Então, um brinde às diferenças. Mas sem Skol, por favor.
11 de agosto de 2010
Tenha um bom dia, tchau!
Se tem um troço que me incomoda é ser mal atendido em estabelecimentos comerciais.
Tem certos tipos de mal-atendimento que eu até tolero. Às vezes o lugar está cheio, e o filho da puta do patrão, para economizar, decide não colocar mais funcionários - aí eu acho foda esculachar com os empregados sobrecarregados.
Mas tem um procedimento específico que me emputece deveras: é quando os funcionários se esquecem que são funcionários, e se esquecem que você é cliente, e decidem agir como seres humanos normais.
Eu explico.
Certa vez, quando morava em Londrina, desci do ônibus depois da faculdade e passei em uma padaria perto da minha casa para comer um lanche. Eram umas 22h30. Pedi um misto-quente e a mulher do balcão gritou para a cozinha: "Um misto-quente, Alzira!". No que a Alzira respondeu, também em tom elevado, para ser ouvida: "Ah, agora não vai dar não, meu ônibus vai passar daqui a dez minutos".
É disso que estou falando.
Porra, existe um protocolo atendente-cliente que deve ser respeitado! É pedir demais? Se a Alzira tinha que pegar seu busão, porque não chamou seu chefe no canto e o avisou em voz baixa? O encarregado teria dado um jeito; colocaria a moça do caixa para fazer o lanche enquanto a substituta da Alzira não chegasse, por exemplo; talvez o lanche demorasse um pouco e não ficasse tão bom, mas eu comeria e iria embora sem saber que naquele lugar a mulher que faz misto-quente pega busão para voltar para casa. É algo que eu, como cliente, NÃO PRECISO SABER.
Aí nesta semana, no Pão de Açúcar da avenida Independência, em Ribeirão (que aliás está uma zona por causa da reforma), outro exemplo me cai no colo. Segue o diálogo entre a moça empacotadora e a caixa, enquanto ela passa minhas compras:
- Será que vai rodar mais alguém?
- Ih, até o meio-dia tem chão, viu? Bem que podia ser eu. Não aguento mais isso aqui.
- (risos) Ah, para você sair é difícil.
- Já pensou? 'Fulana (pouparei o nome dela), vou te dar um pé na bunda' (com entonação de voz masculina). Ahahaha.
- Ahahahaha.
Breve silêncio. A caixa retoma o fio da meada, enquanto passa meu cartão - eram poucas compras.
- Pra eu sair daqui, só arrumando outra coisa melhor antes e pedindo demissão.
- Ou então você xinga algum cliente, aí ele vai lá e reclama no serviço de atendimento e você é demitida.
- É uma boa, já pensou, menina? Ahahahaha...
- Ahahahaha...
A caixa me entrega a nota e, engolindo o riso do diálogo anterior, me diz:
- Obrigada moço, tenha um bom dia, tchau!
Tem certos tipos de mal-atendimento que eu até tolero. Às vezes o lugar está cheio, e o filho da puta do patrão, para economizar, decide não colocar mais funcionários - aí eu acho foda esculachar com os empregados sobrecarregados.
Mas tem um procedimento específico que me emputece deveras: é quando os funcionários se esquecem que são funcionários, e se esquecem que você é cliente, e decidem agir como seres humanos normais.
Eu explico.
Certa vez, quando morava em Londrina, desci do ônibus depois da faculdade e passei em uma padaria perto da minha casa para comer um lanche. Eram umas 22h30. Pedi um misto-quente e a mulher do balcão gritou para a cozinha: "Um misto-quente, Alzira!". No que a Alzira respondeu, também em tom elevado, para ser ouvida: "Ah, agora não vai dar não, meu ônibus vai passar daqui a dez minutos".
É disso que estou falando.
Porra, existe um protocolo atendente-cliente que deve ser respeitado! É pedir demais? Se a Alzira tinha que pegar seu busão, porque não chamou seu chefe no canto e o avisou em voz baixa? O encarregado teria dado um jeito; colocaria a moça do caixa para fazer o lanche enquanto a substituta da Alzira não chegasse, por exemplo; talvez o lanche demorasse um pouco e não ficasse tão bom, mas eu comeria e iria embora sem saber que naquele lugar a mulher que faz misto-quente pega busão para voltar para casa. É algo que eu, como cliente, NÃO PRECISO SABER.
Aí nesta semana, no Pão de Açúcar da avenida Independência, em Ribeirão (que aliás está uma zona por causa da reforma), outro exemplo me cai no colo. Segue o diálogo entre a moça empacotadora e a caixa, enquanto ela passa minhas compras:
- Será que vai rodar mais alguém?
- Ih, até o meio-dia tem chão, viu? Bem que podia ser eu. Não aguento mais isso aqui.
- (risos) Ah, para você sair é difícil.
- Já pensou? 'Fulana (pouparei o nome dela), vou te dar um pé na bunda' (com entonação de voz masculina). Ahahaha.
- Ahahahaha.
Breve silêncio. A caixa retoma o fio da meada, enquanto passa meu cartão - eram poucas compras.
- Pra eu sair daqui, só arrumando outra coisa melhor antes e pedindo demissão.
- Ou então você xinga algum cliente, aí ele vai lá e reclama no serviço de atendimento e você é demitida.
- É uma boa, já pensou, menina? Ahahahaha...
- Ahahahaha...
A caixa me entrega a nota e, engolindo o riso do diálogo anterior, me diz:
- Obrigada moço, tenha um bom dia, tchau!
10 de agosto de 2010
Post para um amigo
Paulo Freire defendia a educação transformadora - e mais um monte de outras coisas que eu não vou escrever aqui porque o objeto do post não é o Paulo Freire. Mas é impossível não se lembrar dele ao ter contato com o trabalho do meu amigo Daniel e o Núcleo de Vivência Teatral, da cidade de Iracemápolis (bem pertinho de Limeira).
Depois de uns dois anos de insistência, muitos convites, datas desencontradas e, confesso, uma boa dose de acomodação, finalmente consegui assistir a uma peça do grupo, no último domingo, no encerramento da Mostra Municipal de Teatro de Limeira, no Teatro Vitória, naquela cidade. Como estava em Campinas na casa do sogrão para o Dia dos Pais, não foi difícil dar uma esticada até lá.
A peça é uma adaptação do conto "A hora e vez de Augusto Matraga", de João Guimarães Rosa (aos interessados, o conto jaz nas últimas páginas de "Sagarana", e é altamente recomendado, assim como toda a obra do Guimarães Rosa). A peculiaridade é a seguinte: no Núcleo de Vivência Teatral, os atores são crianças (no máximo, pré-adolescentes). E quem conhece "Matraga" sabe que a história não tem nada de infantil - assim como "Macbeth", montagem anterior do grupo, que agora eu me castigo por ter perdido.
O Daniel é um grande amigo dos tempos de faculdade, e nas poucas vezes em que temos nos falado ultimamente, ele sempre deixa evidente a alegria que tem com o trabalho no Núcleo. Conta com muito entuasiasmo sobre o talento da meninada, suas realizações e para onde pode ir. Então, admito que tinha uma pulga atrás da orelha sobre o que veria no palco: ao mesmo tempo em que estava com uma certa expectativa para ver logo aquele trabalho, imaginava também que a coisa podia não ser tão legal assim como o Daniel falava, já que ele é naturalmente suspeito para falar de sua cria.
Afinal, "são crianças", pensei; "o teatro é grande e está lotado, deve ser difícil para eles"; "Guimarães Rosa não é tão fácil de digerir."
Ao fim dos primeiros, sei lá, dez minutos de apresentação, meu queixo estava caído, eu estava sinceramente emocionado e me perguntava por que diabos aquilo tudo estava sendo encenado "só" em um teatro de Limeira - com a entrada franca - em uma noite perdida de um agosto qualquer.
Não entendo patavina de teatro, mas posso garantir que vi algo espetacular, impressionante e adjetivamente impossível de classificar. A introdução da peça é cinematográfica e remete a... Irmãos Coen? Não, não... Tarantino? Talvez... A trilha sonora vai de Sepultura a Jacques Morelembaum, passando por Zeca Baleiro; há momentos de humor, drama, tensão, metalinguagem...
As crianças... Bem, as crianças são "O" espetáculo. Eu sinceramente fiquei com medo quando um menino apareceu em cena "fumando" um cigarro apagado, ou com as referências indiretas à prostituição, feitas por meninos de... melhor nem chutar a idade. "Caramba, será que tem algum promotor da infância xarope por aqui ou alguém da patrulha dos bons costumes?", pensei. "O Daniel vai sair daqui preso". Pura bobagem, claro - tudo ali estava muito bem encaixado dentro de um contexto, e qualquer débil-mental pode entender isso (crianças que encenam Guimarães Rosa, então...).
Certa vez, acompanhando o blog do Núcleo de Vivência Teatral, li alguém dizendo que, assistindo às peças, a gente até se esquece que são crianças que estão no palco. Eu discordo. Dá pra ver bem que são crianças sim, o tempo todo, mas crianças fazendo algo que delas não se costuma exigir, porque nós, adultos, geralmente achamos que elas não são capazes. Dizer que agem como adultos (como se ser adulto fosse pressuposto básico para fazer qualquer coisa de qualidade) seria desqualificá-las.
No palco, elas fazem coisas que delas não se esperam, ainda mais no teatro. Não estão vestidas de árvore, pedra ou flor, nem voando como Sininho penduradas por cordas, muito menos cantando a 9ª Sinfonia de Beethoven em um coral natalino. Estão falando palavrão, pegando em armas e dizendo frases como "Diabo não existe; existe é homem humano. Travessia" (de "Grande Sertão: Veredas"). Ficar impressionado é inevitável.
Depois de quase duas horas (!) de peça, não podia sentir nada diferente de orgulho, muito orgulho. Orgulho de ser amigo de um grande cara, que parece ter encontrado sua paragem no grande sertão. Alguém que, na república que morávamos em Londrina, passava horas lendo livros cheios de nomes russos e gregos, e discutia comigo onde aquilo tudo iria nos levar (eu só lia jornais e revistas, mesmo).
Depois da peça, lembrávamos desses tempos e das peças que o Daniel apresentava com seus colegas da turma de Artes Cênicas (tinha algumas legais, mas a maioria eu nunca entendi). Ele então disse: "Pois é, o teatro está aí para contar boas histórias, e a gente ficava perdendo tempo naquele monte de intelectualidades." Mais orgulho ainda. Daniel Martins - guardem esse nome, vocês ainda vão ouvir falar dele.
Uma noite memorável. E transformadora.
PS: As fotos foram retiradas do blog do Núcleo de Vivência Teatral. O crédito da segunda foto é de Nelson Shiraga. Das outras, eu não sei.
Depois de uns dois anos de insistência, muitos convites, datas desencontradas e, confesso, uma boa dose de acomodação, finalmente consegui assistir a uma peça do grupo, no último domingo, no encerramento da Mostra Municipal de Teatro de Limeira, no Teatro Vitória, naquela cidade. Como estava em Campinas na casa do sogrão para o Dia dos Pais, não foi difícil dar uma esticada até lá.
A peça é uma adaptação do conto "A hora e vez de Augusto Matraga", de João Guimarães Rosa (aos interessados, o conto jaz nas últimas páginas de "Sagarana", e é altamente recomendado, assim como toda a obra do Guimarães Rosa). A peculiaridade é a seguinte: no Núcleo de Vivência Teatral, os atores são crianças (no máximo, pré-adolescentes). E quem conhece "Matraga" sabe que a história não tem nada de infantil - assim como "Macbeth", montagem anterior do grupo, que agora eu me castigo por ter perdido.
O Daniel é um grande amigo dos tempos de faculdade, e nas poucas vezes em que temos nos falado ultimamente, ele sempre deixa evidente a alegria que tem com o trabalho no Núcleo. Conta com muito entuasiasmo sobre o talento da meninada, suas realizações e para onde pode ir. Então, admito que tinha uma pulga atrás da orelha sobre o que veria no palco: ao mesmo tempo em que estava com uma certa expectativa para ver logo aquele trabalho, imaginava também que a coisa podia não ser tão legal assim como o Daniel falava, já que ele é naturalmente suspeito para falar de sua cria.
Afinal, "são crianças", pensei; "o teatro é grande e está lotado, deve ser difícil para eles"; "Guimarães Rosa não é tão fácil de digerir."
Ao fim dos primeiros, sei lá, dez minutos de apresentação, meu queixo estava caído, eu estava sinceramente emocionado e me perguntava por que diabos aquilo tudo estava sendo encenado "só" em um teatro de Limeira - com a entrada franca - em uma noite perdida de um agosto qualquer.
Não entendo patavina de teatro, mas posso garantir que vi algo espetacular, impressionante e adjetivamente impossível de classificar. A introdução da peça é cinematográfica e remete a... Irmãos Coen? Não, não... Tarantino? Talvez... A trilha sonora vai de Sepultura a Jacques Morelembaum, passando por Zeca Baleiro; há momentos de humor, drama, tensão, metalinguagem...
As crianças... Bem, as crianças são "O" espetáculo. Eu sinceramente fiquei com medo quando um menino apareceu em cena "fumando" um cigarro apagado, ou com as referências indiretas à prostituição, feitas por meninos de... melhor nem chutar a idade. "Caramba, será que tem algum promotor da infância xarope por aqui ou alguém da patrulha dos bons costumes?", pensei. "O Daniel vai sair daqui preso". Pura bobagem, claro - tudo ali estava muito bem encaixado dentro de um contexto, e qualquer débil-mental pode entender isso (crianças que encenam Guimarães Rosa, então...).
Certa vez, acompanhando o blog do Núcleo de Vivência Teatral, li alguém dizendo que, assistindo às peças, a gente até se esquece que são crianças que estão no palco. Eu discordo. Dá pra ver bem que são crianças sim, o tempo todo, mas crianças fazendo algo que delas não se costuma exigir, porque nós, adultos, geralmente achamos que elas não são capazes. Dizer que agem como adultos (como se ser adulto fosse pressuposto básico para fazer qualquer coisa de qualidade) seria desqualificá-las.
No palco, elas fazem coisas que delas não se esperam, ainda mais no teatro. Não estão vestidas de árvore, pedra ou flor, nem voando como Sininho penduradas por cordas, muito menos cantando a 9ª Sinfonia de Beethoven em um coral natalino. Estão falando palavrão, pegando em armas e dizendo frases como "Diabo não existe; existe é homem humano. Travessia" (de "Grande Sertão: Veredas"). Ficar impressionado é inevitável.
Depois de quase duas horas (!) de peça, não podia sentir nada diferente de orgulho, muito orgulho. Orgulho de ser amigo de um grande cara, que parece ter encontrado sua paragem no grande sertão. Alguém que, na república que morávamos em Londrina, passava horas lendo livros cheios de nomes russos e gregos, e discutia comigo onde aquilo tudo iria nos levar (eu só lia jornais e revistas, mesmo).
Depois da peça, lembrávamos desses tempos e das peças que o Daniel apresentava com seus colegas da turma de Artes Cênicas (tinha algumas legais, mas a maioria eu nunca entendi). Ele então disse: "Pois é, o teatro está aí para contar boas histórias, e a gente ficava perdendo tempo naquele monte de intelectualidades." Mais orgulho ainda. Daniel Martins - guardem esse nome, vocês ainda vão ouvir falar dele.
Uma noite memorável. E transformadora.
PS: As fotos foram retiradas do blog do Núcleo de Vivência Teatral. O crédito da segunda foto é de Nelson Shiraga. Das outras, eu não sei.
7 de agosto de 2010
O novo nome
Muito bem.
Quando eu iniciei este blog, lá em 2006, os tempos eram outros. Ganso e Neymar ainda não eram unanimidade nacional, Ronaldo não jogava no Corinthians, Dilma não era nem pré-pré-pré-candidata e eu não era casado (nem namorava minha mulher). Estava em outra "vibe", por assim dizer.
Já tinha um outro blog - vaca.tipos.com.br -, este feito em parceria com a velha patota da faculdade, com um perfil de zoeira total e estímulo livre à trollagem virtual, então queria algo que fosse mais pessoal mesmo. Aí surgiu o but not in love.
O nome eu já expliquei aqui, mas para resumir é um verso da minha música preferida da minha banda preferida ("Fitter Happier", do Radiohead). Foi a música que, quando eu tinha meus 18 anos, me fez ver que a vida é nada mais que uma série de modelos que repetimos infinitamente, o que me deixou deveras triste e ao mesmo tempo impressionado.
Hoje, ainda me impressiono com a música, mas o nome não cabe mais. Está ultrapassado, expirou seu prazo, não resume mais minha vida como já resumiu outrora e, convenhamos, é um tanto o quanto afeminado.
Então, está aí a mudança. Não vou ficar explicando o "conceito" do novo nome porque seria muita pseudagem, mas ele até que existe (acho até que um pouco autoexplicativo). O que continua valendo mesmo é a descrição: "um monte de bobagens que, acredite, você não terá o menor interesse em ler." É a coisa mais sincera que já escrevi por aqui, e ao mesmo tempo me desabona de qualquer responsabilidade pelos posts.
Por este, inclusive.
PS: O endereço para acesso do blog era para ser validadevencida.blogspot.com, mas é óbvio que esse domínio já existe (e anta aqui não checou antes). Como não quis mudar o nome recém-mudado de novo, mudei o endereço: é http://venceu.blogspot.com. Meus queridos seguidores, atualizem seus bookmarks!
Quando eu iniciei este blog, lá em 2006, os tempos eram outros. Ganso e Neymar ainda não eram unanimidade nacional, Ronaldo não jogava no Corinthians, Dilma não era nem pré-pré-pré-candidata e eu não era casado (nem namorava minha mulher). Estava em outra "vibe", por assim dizer.
Já tinha um outro blog - vaca.tipos.com.br -, este feito em parceria com a velha patota da faculdade, com um perfil de zoeira total e estímulo livre à trollagem virtual, então queria algo que fosse mais pessoal mesmo. Aí surgiu o but not in love.
O nome eu já expliquei aqui, mas para resumir é um verso da minha música preferida da minha banda preferida ("Fitter Happier", do Radiohead). Foi a música que, quando eu tinha meus 18 anos, me fez ver que a vida é nada mais que uma série de modelos que repetimos infinitamente, o que me deixou deveras triste e ao mesmo tempo impressionado.
Hoje, ainda me impressiono com a música, mas o nome não cabe mais. Está ultrapassado, expirou seu prazo, não resume mais minha vida como já resumiu outrora e, convenhamos, é um tanto o quanto afeminado.
Então, está aí a mudança. Não vou ficar explicando o "conceito" do novo nome porque seria muita pseudagem, mas ele até que existe (acho até que um pouco autoexplicativo). O que continua valendo mesmo é a descrição: "um monte de bobagens que, acredite, você não terá o menor interesse em ler." É a coisa mais sincera que já escrevi por aqui, e ao mesmo tempo me desabona de qualquer responsabilidade pelos posts.
Por este, inclusive.
PS: O endereço para acesso do blog era para ser validadevencida.blogspot.com, mas é óbvio que esse domínio já existe (e anta aqui não checou antes). Como não quis mudar o nome recém-mudado de novo, mudei o endereço: é http://venceu.blogspot.com. Meus queridos seguidores, atualizem seus bookmarks!
30 de julho de 2010
Ih, lá vem
Pronto, fodeu: comecei a me preocupar demais com o blog e a gastar mais tempo pensando nele do que ele merece.
O primeiro reflexo disso é que ele vai mudar de nome.
Já não era sem tempo.
Em breve. Ou não.
O primeiro reflexo disso é que ele vai mudar de nome.
Já não era sem tempo.
Em breve. Ou não.
27 de julho de 2010
Possessões noturnas (ou sobre minha melhor consulta com o dr. Google)
Não me lembro quando começou, acho que foi quando morava em Rio Preto (2006). Mas pode ter sido antes. O nome é paralisia do sono, mas isso eu só fui descobrir depois.
É assim: você está dormindo, e de repente acorda. Mas não consegue se mexer. Então pensa: "bom, devo estar dormindo, isso é um sonho." No fundo, você sabe que não é. Enquanto isso, ouve barulhos (na maioria das vezes, comigo, são sons fortes, como se uma britadeira estivesse dentro da minha cabeça) e até vê coisas (já vi luzes, sombras, formas desconexas, enfim). É assustador.
Pelo que pude entender do que já li por aí, nosso sistema nervoso envia um comando para os nervos que paralisa os músculos durante certas fases do sono, e a paralisia ocorre justamente quando a consciência desperta, mas o comando continua a ser enviado.
Na primeira vez que aconteceu, depois que acordei, de manhã, me lembrei do fato e resolvi ignorá-lo, tamanha era minha preocupação com a bizarrice daquilo tudo. Então aconteceu outras vezes, sempre em um curto espaço de tempo (até mesmo em uma viagem de ônibus, uma vez) e eu resolvi buscar ajuda.
Neurologista? Não. Ia acabar fazendo um eletro, uma tomografia, ele certamente ia associar aquilo às minhas crises de epilepsia do passado e eu ia ter que tomar um belo tarja preta - tô fora. Psiquiatra? Psicólogo? Podia ser, mas eu precisava de algo bem mais prático e confortante. Uma religião, talvez?
Apelei para a mescla entre religião e ciência: o deus Google, arauto dos desesperados, ícone maior da sabedoria humana na pós-modernidade.
Lá, aprendi que a paralisia do sono é considerado um distúrbio leve de sono (leve porque não afeta diretamente a vida do indivíduo, como a narcolepsia ou o sonambulismo), e que sabe-se muito pouco sobre suas causas (estresse pode ser uma delas - jornalismo, oi?). Cerca de 50% da população teve ou vai ter ao menos um episódio durante a vida.
Mas o melhor ainda vem: a paralisia do sono tem uma ligação profunda com a cultura de vários povos, já que é sempre associada a possessões demoníacas, ligações com espíritos e até abduções por ETs (cientistas acham que boa parte dos relatos noturnos sobre fatos como esses se devem à paralisia do sono). No Brasil, existe uma personagem do folclore para o distúrbio, a Pisadeira.
Em uma comunidade do Orkut (não vou linkar porque já saí dela e estou com preguiça de procurar de novo), aprendi inclusive dicas de como se livrar das crises - se concentrar para tentar mexer o dedão do pé, por exemplo.
Em outro site, eles ensinam que a paralisia do sono é a porta de entrada para o tal do sonho lúcido, um tipo de sonho que você pode controlar. "Massa", pensei, "quando tiver isso outra vez vou pensar na Scarlett Johansson e Penelope Cruz em uma praia deserta".
O grande problema é que a paralisia do sono sempre te pega de surpresa, e sempre assusta - a não ser que você tenha crises todos os dias e já esteja acostumado com elas, o que eu acho que, aí sim, seja um problema que necessite de tratamento médico.
Curiosamente, depois que me informei, as ocorrências cessaram por um longo período, até que eu tive uma no último fim de semana. Vi uma luz meio opaca na porta do meu quarto, enquanto uma turbina de avião girava a mil a alguns centímetros dos meus ouvidos; tentei gritar e me virar na cama - tudo em vão.
Scarlett Johansson? Penelope Cruz? Fica para a próxima, quem sabe.
É assim: você está dormindo, e de repente acorda. Mas não consegue se mexer. Então pensa: "bom, devo estar dormindo, isso é um sonho." No fundo, você sabe que não é. Enquanto isso, ouve barulhos (na maioria das vezes, comigo, são sons fortes, como se uma britadeira estivesse dentro da minha cabeça) e até vê coisas (já vi luzes, sombras, formas desconexas, enfim). É assustador.
Pelo que pude entender do que já li por aí, nosso sistema nervoso envia um comando para os nervos que paralisa os músculos durante certas fases do sono, e a paralisia ocorre justamente quando a consciência desperta, mas o comando continua a ser enviado.
Na primeira vez que aconteceu, depois que acordei, de manhã, me lembrei do fato e resolvi ignorá-lo, tamanha era minha preocupação com a bizarrice daquilo tudo. Então aconteceu outras vezes, sempre em um curto espaço de tempo (até mesmo em uma viagem de ônibus, uma vez) e eu resolvi buscar ajuda.
Neurologista? Não. Ia acabar fazendo um eletro, uma tomografia, ele certamente ia associar aquilo às minhas crises de epilepsia do passado e eu ia ter que tomar um belo tarja preta - tô fora. Psiquiatra? Psicólogo? Podia ser, mas eu precisava de algo bem mais prático e confortante. Uma religião, talvez?
Apelei para a mescla entre religião e ciência: o deus Google, arauto dos desesperados, ícone maior da sabedoria humana na pós-modernidade.
Lá, aprendi que a paralisia do sono é considerado um distúrbio leve de sono (leve porque não afeta diretamente a vida do indivíduo, como a narcolepsia ou o sonambulismo), e que sabe-se muito pouco sobre suas causas (estresse pode ser uma delas - jornalismo, oi?). Cerca de 50% da população teve ou vai ter ao menos um episódio durante a vida.
Este quadro se chama "O Pesadelo", de John Henry Fuseli, e todo mundo o utiliza para ilustrar a paralisia do sono (então eu vou usar também)
Mas o melhor ainda vem: a paralisia do sono tem uma ligação profunda com a cultura de vários povos, já que é sempre associada a possessões demoníacas, ligações com espíritos e até abduções por ETs (cientistas acham que boa parte dos relatos noturnos sobre fatos como esses se devem à paralisia do sono). No Brasil, existe uma personagem do folclore para o distúrbio, a Pisadeira.
Em uma comunidade do Orkut (não vou linkar porque já saí dela e estou com preguiça de procurar de novo), aprendi inclusive dicas de como se livrar das crises - se concentrar para tentar mexer o dedão do pé, por exemplo.
Em outro site, eles ensinam que a paralisia do sono é a porta de entrada para o tal do sonho lúcido, um tipo de sonho que você pode controlar. "Massa", pensei, "quando tiver isso outra vez vou pensar na Scarlett Johansson e Penelope Cruz em uma praia deserta".
O grande problema é que a paralisia do sono sempre te pega de surpresa, e sempre assusta - a não ser que você tenha crises todos os dias e já esteja acostumado com elas, o que eu acho que, aí sim, seja um problema que necessite de tratamento médico.
Curiosamente, depois que me informei, as ocorrências cessaram por um longo período, até que eu tive uma no último fim de semana. Vi uma luz meio opaca na porta do meu quarto, enquanto uma turbina de avião girava a mil a alguns centímetros dos meus ouvidos; tentei gritar e me virar na cama - tudo em vão.
Scarlett Johansson? Penelope Cruz? Fica para a próxima, quem sabe.
18 de julho de 2010
Reabilitando Luís Manzoli
Tinha quase me esquecido porque meu avatar no MSN é um auto-retrato (foda-se os dois "r", este blog só segue as novas normas da língua portuguesa que acha interessante) do Neil Swaab.
Até que hoje fui organizar os links ali do lado direito e voltei a dar uma sapeada pela página do Mr. Wiggles.
Tem que clicar pra ver maior - e saber um pouquinho só de inglês
Gênio.
14 de julho de 2010
Obra demoníaca
Já comentei com vocês que minha família veio me visitar no feriado.
Minha sobrinha está para fazer um aninho, e a mãe dela (minha irmã) trouxe o DVD da "Galinha Pintadinha", que ela adora, para distrai-la caso precisasse. Infelizmente, precisou.
A obra é nacional, elaborada pela Bromélia Filminhos, de Campinas. O site oficial da bagaça resume a obra como "animações com as músicas do cancioneiro popular brasileiro que educam e divertem as crianças". É exatamente isso.
É claro que não é algo que eu, ou qualquer outro leitor deste blog, colocaria em sã consicência para assistir não fosse por causa de uma criança. E seria bem tolerável, para dizer o mínimo.
Não fosse a Mariana.
Ouvi isso aí UMA VEZ no fim de semana todo. Na noite de domingo para segunda, quando fui acordado no meio da madrugada pela crise de rinite (oi, amiga!), a música estava na minha cabeça, e juro que isso me irritou a ponto de atrapalhar a volta do meu sono.
Na segunda, terça e hoje, lá estava ela, a Mariana, com seu sorriso largo, ocupando um espaço imenso na minha cabeça, alinhada à inesquecível canção como trilha sonora. Até que eu me toquei: eu precisava ouvir a música de novo. E, ao fazer isso, veio a surpresa: uma sensação de prazer, de alívio, como numa sessão de sadomasoquismo.
A Mariana é auspiciosa: fez mal ao se instalar, mas agora que já me transformou, precisa ser alimentada. E, é claro, divulgada.
Me desculpem, amigos. É bem mais forte que eu.
Minha sobrinha está para fazer um aninho, e a mãe dela (minha irmã) trouxe o DVD da "Galinha Pintadinha", que ela adora, para distrai-la caso precisasse. Infelizmente, precisou.
A obra é nacional, elaborada pela Bromélia Filminhos, de Campinas. O site oficial da bagaça resume a obra como "animações com as músicas do cancioneiro popular brasileiro que educam e divertem as crianças". É exatamente isso.
É claro que não é algo que eu, ou qualquer outro leitor deste blog, colocaria em sã consicência para assistir não fosse por causa de uma criança. E seria bem tolerável, para dizer o mínimo.
Não fosse a Mariana.
Ouvi isso aí UMA VEZ no fim de semana todo. Na noite de domingo para segunda, quando fui acordado no meio da madrugada pela crise de rinite (oi, amiga!), a música estava na minha cabeça, e juro que isso me irritou a ponto de atrapalhar a volta do meu sono.
Na segunda, terça e hoje, lá estava ela, a Mariana, com seu sorriso largo, ocupando um espaço imenso na minha cabeça, alinhada à inesquecível canção como trilha sonora. Até que eu me toquei: eu precisava ouvir a música de novo. E, ao fazer isso, veio a surpresa: uma sensação de prazer, de alívio, como numa sessão de sadomasoquismo.
A Mariana é auspiciosa: fez mal ao se instalar, mas agora que já me transformou, precisa ser alimentada. E, é claro, divulgada.
Me desculpem, amigos. É bem mais forte que eu.
13 de julho de 2010
A gente só queria um hamburguer
Na quinta-feira à noite, fui com minha mulher ao The Fifties, rede de lanchonetes com ar retrô (como o nome sugere) que inaugurou bem recentemente sua unidade em Ribeirão Preto, no RibeirãoShopping.
Chegamos no lugar às 20h20, pegamos a senha e fomos orientados a esperar "uns 10 minutos" até conseguirmos uma mesa - algo bem normal, ainda mais para uma nova lanchonete em Ribeirão (o povo daqui adora uma novidade, né?). Me lembro bem do horário porque olhei no relógio para ver quanto tempo esperaríamos.
Bom, esperamos bem menos que isso, e certamente antes das 20h30 estávamos acomodados com o cardápio na mão, em uma daquelas mesas onde um dos assentos é um sofá apoiado na parede (minha mulher adora isso). Um casal que nos deu espaço para sentar enquanto esperávamos pela mesa do lado de fora entrou em seguida e ficou na mesa logo ao lado.
Fizemos nosso pedido: uma coca, um suco de laranja, uma porção de "onion rings" e dois lanches. O casal ao lado fez o pedido quando o garçon trouxe nossas bebidas - você deve estar se perguntando "nossa, que povo enxerido, fica reparando no que o vizinho de mesa faz, é?", mas é que o espaço entre as mesas não é assim tão vasto, e fica impossível não reparar. E isso nem é uma crítica. Ainda.
Assim que chegou nossa cebola, pedimos uma porção de maionese para acompanhar (lá é TUDO cobrado separado - inclusive na montagem do hamburguer). E aí começou nosso tormento. Se me permitem dizer, a cebola estava excessivamente encharcada com óleo. Bem diferente da servida na Duets, por exemplo. Posso estar sendo cricri demais, mas enfim, é algo que não pretendo pedir de novo (se um dia voltar lá).
A maionese nunca veio. Os lanches, idem. O casal ao lado estava termimando de comer, tinha recebido a porção de molho barbecue e já estava com o cardápio em mãos para escolher a sobremesa. Eu e minha mulher lá, parados, com uma porção de cebola pela metade, uma lata de coca vazia e um copo de suco idem.
Neste ínterim, ouço um estampido e gritos atrás de mim. Minha mulher se assustou: um globo de uma lâmpada que pendia do teto caiu e, diz ela, por muito pouco, não acertou um rapaz que saboreava seu delicioso hamburguer com gostinho de anos 50. O troço caiu atrás dele, no topo da cabeceira do sofá onde estava sentado. Os funcionários se olhavam com uma cara tipo "WTF?".
Lá pelas tantas, um cara que parecia ser o gerente com um ritmo meio frenético passou pela mesa perguntando "e aí, tudo certo por aqui?" e se foi antes de ouvir direito minha resposta, resmungando, de saída, algo como "OK, vou verificar". Minha mulher começou a se impacientar e pediu para irmos embora. Eu argumentava: "Meu, isso aqui não é McDonald's, vamos esperar mais um pouco", talvez ainda iludido pelo desejo estomacal de comer um belo hamburguer.
Às 21h04, ainda às moscas, minha paciência também acabou. Chamei o garçon, pedi que cancelasse os lanches e que trouxesse a conta com o que fora consumido. Ele não fez isso. Se mandou para a cozinha e, às 21h09, voltou com nossos lanches (que, vale ressaltar, não tinham nenhum ingrediente estrambólico em sua composição). Eu disse: "Amigo, eu pedi o cancelamento e a conta. A maionese também não veio até agora, de qualquer forma... Quarenta minutos é muito tempo".
Ele balbuciou um "sim senhor" e trouxe a conta. E teve a pachorra de COBRAR OS 10% pelo serviço. Fiz questão de não pagar a taxa e me fui. Ninguém veio falar comigo, perguntar o que houve, dizer que sentia muito, talvez explicar que era um lugar novo e que estava em fase de adaptação... Nada disso. Nossa saída do The Fifties foi como nossa permanência no lugar: éramos invisíveis.
Dizem que o hamburguer de lá é bom. Mas juro, eu não estou mais disposto a experimentar. Neste caso, infelizmente, a primeira impressão foi a que ficou.
Chegamos no lugar às 20h20, pegamos a senha e fomos orientados a esperar "uns 10 minutos" até conseguirmos uma mesa - algo bem normal, ainda mais para uma nova lanchonete em Ribeirão (o povo daqui adora uma novidade, né?). Me lembro bem do horário porque olhei no relógio para ver quanto tempo esperaríamos.
Bom, esperamos bem menos que isso, e certamente antes das 20h30 estávamos acomodados com o cardápio na mão, em uma daquelas mesas onde um dos assentos é um sofá apoiado na parede (minha mulher adora isso). Um casal que nos deu espaço para sentar enquanto esperávamos pela mesa do lado de fora entrou em seguida e ficou na mesa logo ao lado.
Fizemos nosso pedido: uma coca, um suco de laranja, uma porção de "onion rings" e dois lanches. O casal ao lado fez o pedido quando o garçon trouxe nossas bebidas - você deve estar se perguntando "nossa, que povo enxerido, fica reparando no que o vizinho de mesa faz, é?", mas é que o espaço entre as mesas não é assim tão vasto, e fica impossível não reparar. E isso nem é uma crítica. Ainda.
Assim que chegou nossa cebola, pedimos uma porção de maionese para acompanhar (lá é TUDO cobrado separado - inclusive na montagem do hamburguer). E aí começou nosso tormento. Se me permitem dizer, a cebola estava excessivamente encharcada com óleo. Bem diferente da servida na Duets, por exemplo. Posso estar sendo cricri demais, mas enfim, é algo que não pretendo pedir de novo (se um dia voltar lá).
A maionese nunca veio. Os lanches, idem. O casal ao lado estava termimando de comer, tinha recebido a porção de molho barbecue e já estava com o cardápio em mãos para escolher a sobremesa. Eu e minha mulher lá, parados, com uma porção de cebola pela metade, uma lata de coca vazia e um copo de suco idem.
Neste ínterim, ouço um estampido e gritos atrás de mim. Minha mulher se assustou: um globo de uma lâmpada que pendia do teto caiu e, diz ela, por muito pouco, não acertou um rapaz que saboreava seu delicioso hamburguer com gostinho de anos 50. O troço caiu atrás dele, no topo da cabeceira do sofá onde estava sentado. Os funcionários se olhavam com uma cara tipo "WTF?".
Lá pelas tantas, um cara que parecia ser o gerente com um ritmo meio frenético passou pela mesa perguntando "e aí, tudo certo por aqui?" e se foi antes de ouvir direito minha resposta, resmungando, de saída, algo como "OK, vou verificar". Minha mulher começou a se impacientar e pediu para irmos embora. Eu argumentava: "Meu, isso aqui não é McDonald's, vamos esperar mais um pouco", talvez ainda iludido pelo desejo estomacal de comer um belo hamburguer.
Às 21h04, ainda às moscas, minha paciência também acabou. Chamei o garçon, pedi que cancelasse os lanches e que trouxesse a conta com o que fora consumido. Ele não fez isso. Se mandou para a cozinha e, às 21h09, voltou com nossos lanches (que, vale ressaltar, não tinham nenhum ingrediente estrambólico em sua composição). Eu disse: "Amigo, eu pedi o cancelamento e a conta. A maionese também não veio até agora, de qualquer forma... Quarenta minutos é muito tempo".
Ele balbuciou um "sim senhor" e trouxe a conta. E teve a pachorra de COBRAR OS 10% pelo serviço. Fiz questão de não pagar a taxa e me fui. Ninguém veio falar comigo, perguntar o que houve, dizer que sentia muito, talvez explicar que era um lugar novo e que estava em fase de adaptação... Nada disso. Nossa saída do The Fifties foi como nossa permanência no lugar: éramos invisíveis.
Dizem que o hamburguer de lá é bom. Mas juro, eu não estou mais disposto a experimentar. Neste caso, infelizmente, a primeira impressão foi a que ficou.
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